Socialismo

37 anos sem Nahuel Moreno: Um revolucionário internacionalista

Redação

25 de janeiro de 2024
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Em janeiro de 1982 foi fundada a Liga Internacional dos Trabalhadores (LIT), a tarefa mais importante de Moreno, segundo ele.

Hoje, 25 de janeiro, completam-se 37 anos da morte de Hugo Bressano Capacete, revolucionário argentino que ficou conhecido pelo pseudônimo político de Nahuel Moreno. Seu enterro foi acompanhado até o cemitério de Chacarita (Buenos Aires) por uma coluna compacto de 10.000 pessoas, incluindo várias delegações internacionais. Moreno fundou ou contribuiu à fundação de várias organizações políticas em seu país, na América Latina e na Europa. O PSTU é uma dessas organizações.

A trajetória de Moreno esteve marcada por uma luta incansável pela construção da Internacional, a busca de construir um partido revolucionário enraizado na classe operária e a preocupação com a elaboração teórica e programática.

A militância

Moreno nasceu no dia 24 de abril de 1924, na província de Buenos Aires, Argentina. Aos 15 anos ingressou no movimento trotskista em 1940 e quatro anos depois participou da fundação do Grupo Operário Marxista (GOM). Era uma pequena organização que teve de abrir caminho para o trotskismo no interior do movimento operário argentino. A luta pela implantação na classe operária sempre foi uma de suas grandes preocupações, sendo também um traço marcante da corrente internacional construída por ele.

Moreno em sua juventude. Começou a militância aos 15 anos.

Nessa época, surgiam as grandes organizações sindicais na Argentina, e Moreno e o POR (organização que sucede ao GOM) tiveram um papel destacado nesse processo, colaborando com a fundação de alguns dos mais importantes sindicatos, como a Associação Operária Têxtil e o sindicato do frigorífico Anglo-Ciabasa, o maior do país.

Depois do golpe militar pró-imperialista que derrubou Perón, em 1955, Moreno participou como dirigente do Movimento de Agrupações Operárias (MAO) que incluía as organizações sindicais e políticas clandestinas do peronismo, que combateram a ditadura militar.

A década 1960 esteve marcada pela Revolução Cubana. A guerra de guerrilhas se converteu em estratégia única de toda uma geração da esquerda latino-americana. Moreno participou ativamente desse debate, apoiando a revolução cubana, polemizando com a estratégia de guerrilha e defendendo que o trabalho de organização na classe operária deveria ser o centro da atuação revolucionária.

Na década de 1970, da fusão do PRT (também fundado por Moreno) com uma corrente socialista, surgiu o Partido Socialista dos Trabalhadores (PST), que teve um importante papel nas lutas operárias e na resistência à ditadura militar. Declarado ilegal e ferozmente perseguido, teve vários de seus militantes presos, torturados e assassinados.

Em 1982, Moreno fundou o Movimento ao Socialismo (MAS), do qual foi o principal dirigente até sua morte em 1987.

A internacional

Moreno dedicou boa parte de sua militância na atuação na luta pela reconstrução da IV Internacional. Desde 1948, quando participou como delegado do POR do segundo congresso da Internacional e em 1951, do terceiro e também na intervenção nos principais debates teóricos e políticos, assim como em distintos processos revolucionários, forneceu as bases para a construção de uma corrente internacional presente em vários países latino-americanos.

Entre outros processos interviu no debate em 1952, como parte da IV Internacional, polemizou com sua direção sobre a revolução boliviana. Em 1962, com Hugo Blanco, participou do processo revolucionário peruano e, em 1974, interveio na revolução portuguesa.

Nesse período, polemizou com Ernest Mandel, sobre o método do Programa de Transição e o caráter dos partidos. A polêmica foi sintetizada no livro “O Partido e a Revolução”.

Em 1979, impulsionou a formação da Brigada Simón Bolívar, da qual participaram militantes revolucionários de diversos países latino-americanos, que foram à Nicarágua combater com os sandinistas para derrubar o ditador Somoza.

O resultado dessa longa militância foi a Liga Internacional dos Trabalhadores – Quarta Internacional (LIT-QI). Fundada em janeiro de 1982, a LIT-QI foi o produto, dentro do trotskismo, da corrente principista de Moreno, construída na classe operária e sempre no marco de uma organização internacional. Moreno considerava a construção da LIT-QI sua tarefa mais importante. A LIT-QI segue viva e atuante até hoje, seguindo os ensinamentos de Moreno. O PSTU é parte da LIT-QI.

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Uma obsessão pela intervenção e inserção no movimento operário

Em sua longa trajetória, Moreno mostrou-se um mestre na arte de elaborar e propor táticas concretas para intervir na realidade, aproveitar as oportunidades que esta oferecia e construir organizações no seio do movimento de massas, especialmente na classe operária. Por isso, GOM, seu primeiro grupo político, militava na Villa Pobladora, na periferia de Buenos Aires, no coração operário e industrial da Argentina da época.

Esta característica de se conectar à classe operária estava ligada a duas necessidades: primeira, superar a esterilidade do “trotskismo de café” que imperava na Argentina; a segunda, enfrentar o peronismo, um dos movimentos nacionalistas burgueses mais fortes da história.

Ele afirmava que o trotskismo e seu programa deviam ser a expressão política da classe operária, especialmente dos seus setores mais concentrados e explorados. Dizia que essa era a única base de classe possível para que um partido operário revolucionário se construísse e pudesse avançar em sua estratégia.

A luta para romper o cerco da marginalidade política

Moreno sempre estudou com profundidade as situações do mundo e de cada país para, a partir daí, elaborar políticas e orientações corretas. Apontava que era necessário fazer política revolucionária como age um bom médico, que somente indica um tratamento depois de realizar as análises necessárias e elaborar um cuidadoso diagnóstico.

Sempre buscou romper o cerco da marginalidade política, porém, suas táticas estavam baseadas em análises da realidade. Dai sua flexibilidade tática que ia desde as intervenções nos processos eleitorais, até a clandestinidade ou a luta armada contra as ditaduras, passando pela participação nas lutas sindicais.

Seria muito longo enumerar todas elas. Mas para citar apenas alguns exemplos, a edição do jornal “Palavra Operária” com ativistas operários peronistas combativos; a organização e direção dos sindicatos e a luta dos camponeses de Cuzco, Peru, pela reforma agrária junto com Hugo Blanco; a formação da Brigada Simón Bolívar que vai combater na Nicarágua  junto às forças da Frente Sandinista de Libertação Nacional (FSLN) para derrubar a ditadura; a discussão com a Convergência Socialista para o chamado à construção de um Partido dos Trabalhadores no Brasil; a partir de 1982, aproveitando as condições de legalidade eleitoral, sua participação nas lutas operárias e sua intervenção nas chapas sindicais antiburocráticas, o Movimento ao Socialismo (MAS) argentino iria transformar-se no partido mais importante da esquerda do seu país e no maior partido trotskista do mundo.

Seus escritos

Como parte da tradição marxista, Moreno manteve uma preocupação constante com a elaboração teórica e programática. Deixou contribuições importantes e originais no marxismo. A maioria dos seus trabalhos está destinada a analisar, caracterizar e orientar processos políticos concretos ou gerais e é neles onde desenvolve as questões teóricas ou conceituais.

Há alguns que se destacam, dois deles escritos na forma de polêmica, contra as posições de Ernest Mandel. O primeiro é “O Partido e a Revolução” (também conhecido como “O Morenazo”), de 1973, que discute os desvios guerrilheirista, ultraesquerdista e vanguardista de Mandel. O segundo é “A Ditadura Revolucionária do Proletariado” onde critica um novo desvio de Mandel: a tentativa de adaptar o conceito de ditadura do proletariado ao conteúdo da democracia burguesa.

Os textos sobre os governos de Frente Popular e a teoria dos campos burgueses progressivos, publicado no Brasil pela editora Sundermann sob o nome de “Os governos de Frente Popular na História” também estão escritos de forma polêmica, desta vez com Pierre Lambert e a corrente lambertista.

Em relação aos trabalhos mais afastados da política concreta, cabe mencionar dois de caráter teórico-histórico. “Quatro teses sobre a colonização espanhola e portuguesa na América” (1948) combate a caracterização do stalinismo e outras correntes de que a colonização era feudal e não capitalista. E o campo puramente teórico, encontramos “Lógica marxista e ciências modernas”.

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Um militante pela classe operária, pelo socialismo e o internacionalismo

Algumas considerações finais

O movimento trotskista que Moreno conheceu e no qual militou (ao qual definiu como “uma corrente ou movimento independente dos aparelhos burocráticos, embora sem unidade organizativa”) já não existe como tal. Num verdadeiro “vendaval oportunista”, alguns setores importantes desse movimento cruzaram “a fronteira” e abandonaram o campo revolucionário.

Várias organizações nacional-trotskistas e também numerosas seitas, em geral bastante estéreis, que se reivindicam “trotskistas”, continuam existindo. Mas é impossível esperar que delas surja a reconstrução da IV Internacional.

A LIT-QI também sofreu as consequências do “vendaval oportunista” e, após a morte de Nahuel Moreno, passou por uma profunda crise que quase levou ao seu desaparecimento. Mas, tentando seguir os seus conselhos, superou aquela crise e seguiu em frente. Hoje, a LIT-QI, suas seções e militantes procuram intervir nos processos reais da luta de classes e responder aos desafios da realidade desde as trincheiras do marxismo revolucionário.

O legado de Moreno e sua principal construção – a LIT-QI – segue vivo. Mas, tal como ele nos ensinou, não se “autoproclama” a IV Internacional. A LIT deve estar a serviço da reconstrução da IV Internacional como alternativa de direção revolucionária, em momentos em que isto é cada vez mais necessário.

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