Lutas

ENTREVISTA: “Fizemos a greve nacional no 1º de abril para denunciar as mentiras das empresas de aplicativos”

O Opinião Socialista entrevistou Wagner, entregador de Itajaí (SC), que participou do 'Breque dos Apps' nos 31 de março e 1º de abril

Jo Souza, de Itajaí (SC)

4 de abril de 2025
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O ‘Breque dos Apps’, realizado nos dias 31 de março e 1º de abril, atingiu 20 estados | Foto: Reprodução Redes Sociais

Os entregadores por aplicativos (Apps) realizaram uma forte greve nacional por melhores condições de trabalho nos dias 31 de março e 1º de abril.

O Opinião Socialista realizou uma entrevista exclusiva com Wagner, entregador empregado via CLT (Consolidação das Leis do Trabalho) de Itajaí, município de Santa Catarina, que destacou as razões da greve nacional e falou sobre a precarização do trabalho por aplicativos.

Opinião Socialista: Wagner, como você descreve seu dia a dia de trabalho como entregador CLT?
Wagner: É ruim né, vou te falar, bem embassado (complicado). Demora no atendimento, o pessoal sabe que tem que ser ligeiro pra atender  (o entregador), quando chove atrapalha demais, a remuneração não é muito boa, somos uma categoria ainda muito marginalizada pra ter mais autonomia e mais direitos, principalmente para os entregadores de aplicativo. Eu ainda sou CLT, mas os entregadores de aplicativos, quase não tem direito nenhum, se acontecer alguma coisa com eles, ficam ao “deus dará”(sem suporte).

Quais as principais diferenças entre ser CLT e PJ (Pessoa Jurídica) nessa categoria? Você acha que o vínculo CLT garante direitos de verdade, ou ainda há precarização?
A diferença do PJ e do CLT são as férias remuneradas, 13º salário, auxílio doença, que o PJ não tem. Se ele não poupar e não guardar, se estrepa (se dá mal). Só que o trabalho do PJ é precarizado, é barateado a mão de obra do PJ, então como ele vai guardar se ele vive sempre no fio da navalha? Entendeu? Já o CLT não, ele tem tudo isso, mas também não tem boa remuneração. Ambos precisam de um valor maior para sua força de trabalho, bem maior, porque está muito precarizado a nossa mão de obra.

Como as plataformas (iFood, 99, Uber Eats, etc.) pressionam os entregadores CLT? Há ameaças de demissão ou cortes de benefícios?
No caso dos aplicativos é o “block” (bloqueio de acesso ao aplicativo). Eles não dão nenhum suporte pro entregador na hora que acontece alguma ocorrência, não perguntam o que aconteceu e já bloqueiam o entregador. Parece que uma empresa desse tamanho não tem preparo e qualquer pessoa vai lá e bloqueia o motoboy.

Qual o motivo da escolha dos dias 31 e primeiro para as paralisações, sendo dias com tão pouco movimento (segunda e terça-feira), ao invés de paralisar em um dia que causaria mais prejuízo para os aplicativos e empresas que dependem dos entregadores?
Parar no fim de semana poderia até dar um valor maior de prejuízo, mas considerando tudo que o iFood e outros aplicativos ganham, como no ano passado que só o iFood faturou mais de R$ 7 bilhões, não é um fim de semana que vai causar um impacto real. Por isso escolhemos o dia 31 e dia 1º de abril, Dia da Mentira, para facilitar a adesão de motoboys e aproveitar a data para escancarar as mentiras que, principalmente o iFood, que as empresas de aplicativos espalham para precarizar o trabalho dos entregadores.

Como você avalia a greve?
A greve foi forte. O breque foi organizado via grupos de WhatsApp e redes sociais, principalmente, e conseguiu a adesão em 20 estados, afetando todas as plataformas, em cerca de 60 cidades pelo país. A luta tem que seguir, porque são três anos já sem reajuste e é embassado, o negócio é tenso. Toda categoria tem, ou melhor, todas não né, tem umas categoria que também não tá tendo (reajuste), né. Mas é assim, tem que ir pra luta. Se você não for reivindicar o que é seu, se ficar esperando por políticos, vai esperar sentado e vai virar caveira. Já estamos em discussão sobre um novo dia nacional de luta, talvez seja no dia 2 de maio.

Qual sua opinião sobre as reivindicações principais da paralisação  (taxa mínima de R$10, R$2,50/km, limite de 3km para bikes, taxa única por entrega)?
As reivindicações são o justo, né, é o justo. Porque nada mais justo, sabendo das coisas que o motoboy e o ciclista passam de perrengue, não tá no gibi. Então tem que pagar o justo.

Como os entregadores CLT estão se organizando para a greve? Há risco de represálias das empresas?
Nem todo CLT estão juntos, pois como foi dito na pergunta, vai ter represália. Então tem que tomar muito cuidado, o que é errado. Se tivéssemos um sindicato forte, principalmente em Santa Catarina, a coisa seria de outro jeito, mas como não temos, precisamos tomar cuidado.

Você acredita que a união entre entregadores CLT e PJ é importante nessa luta? Por quê?
Muito importante a união dos CLTs com PJs , pois a união faz a força. Como uma frase que disseram pra mim: você sozinho é só um assopro, agora você unido coletivamente com a categoria, você é uma locomotiva sem freio. Então a gente precisa um do outro pra conseguir o que a gente almeja na categoria.

O que você pensa sobre a criação de um sindicato independente e combativo para os entregadores?
Seria bom um sindicato combativo e independente, sem amarras nenhumas, principalmente com o poder político. Seria bem legal, mas vamos chegar nisso, sim.

Alguns dizem que “greve não resolve” e que “é melhor negociar”. O que você responde a isso?
Negociar estamos negociando desde o governo Bolsonaro. Agora passou pro governo Lula e nada mudou. Então vamos seguir lutando, fazendo greve, porque estamos parecendo carretel de pipa na mão dos governantes, só tá sendo enrolado.

O governo Lula e o Ministério do Trabalho têm feito algo para melhorar a vida dos entregadores? Ou só promessas vazias?
Oh cara, enterrou. Ninguém botou pra frente, o governo Lula não tocou pra frente. O ministro da pasta de Trabalho também não tocou pra frente (os projetos de reivindicações dos entregadores). Agora falei na resposta anterior, só estamos sendo enrolados.

As empresas de app dizem que “não têm lucro” para atender às demandas, mas faturam bilhões. O que você diz a isso?
Só pode estar de brincadeira, né? Que eles não tenham condições de dar remuneração decente para os entregadores? Só ver a base deles, parecida com a da Google. Chega a ser cômico ver uma declaração dessas feita por uma empresa do porte da Ifood.

Se as reivindicações seguirem não sendo atendidas, o que a categoria deve fazer? Avançar para greve geral? Ocupar as plataformas?
Sim, sim, vai avançar. Eu até comentei numa reunião que a gente teve, é como numa luta de boxe: tem doze Rounds. A gente vai ter que lutar os doze rounds ou vai ter que nocautear, mas a gente vai conseguir.

A luta dos entregadores é isolada ou você acredita que outros setores (motoboys, caminhoneiros, trabalhadores de apps) deveriam se juntar?
Sim, devia juntar sim e fazer uma paralisação geral no país. A mão de obra do trabalhador está muito precarizada e são eles (os donos das plataformas) que estão botando o preço, não é a gente que coloca, e está muito baixo.

O PSTU tem apoiado as mobilizações. O que você acha do papel de um partido classista na luta dos entregadores?
Acho importante o PSTU ter dado esse apoio pra gente e divulgado. É um partido que está sempre junto com o trabalhador, nunca abandona o trabalhador, não se entrega às benesses que o capitalismo oferece, como outras organizações se deixaram levar e o PSTU não, continua aí, ele continua com o trabalhador na luta.

Que mensagem você deixa para os trabalhadores que têm medo de participar da greve?
Então camaradas, não tenham medo. Como falei numa resposta anterior: sozinhos somos um assopro, agora unidos e unificados somos uma locomotiva sem freio. Então a gente precisa de muita gente pra conseguir alguma coisa. Se a gente não lutar, ninguém vai lutar por nós, pela nossa categoria. Então se junte com a gente e bora, vamos lutar por nossos direitos que são nossos, são justos e são nossos.

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