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CORREIOS: “Privatização vai gerar tarifas altas e muitos municípios carentes ficarão sem assistência postal”

Leia a entrevista com diretores do Sindicato dos Trabalhadores em Correios do Rio Grande do Sul (Sintect-RS)

Redação

19 de setembro de 2025
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Trabalhadores dos Correios em protestos nas ruas de Porto Alegre contra a privatização da estatal

Na semana passada houve toda uma ofensiva da grande imprensa defendendo a privatização dos Correios, tendo como justificativa o anúncio do “prejuízo” da empresa no primeiro semestre deste ano.

O Sindicato dos Trabalhadores em Correios do Rio Grande do Sul (Sintect-RS) elaborou uma excelente resposta pública ao editorial do jornal Folha de S. Paulo,  que pode ser conferido aqui.

O Opinião Socialista realizou uma entrevista com alguns dos diretores do Sindicato, que constroem também a CSP-Conlutas. Leia abaixo:

1) Qual sua opinião sobre este ataque do jornal Folha de S. Paulo? Que interesses estão por trás?
Manoel Rodrigues  – Secretário de Comunicação

Os ataques aos Correios, seja por governos de direita seja por governos “de esquerda” liberal, não são uma novidade para nossa categoria.
O jornal Folha de S. Paulo é um grande defensor do discurso neoliberal e prega o Estado mínimo. A grande questão é: mínimo para quem?
O agronegócio recebe incentivos bilionários todos os anos. Em relação ao escândalo do prejuízo das Americanas não vi nenhum questionamento a respeito da ineficiência do mercado privado. O “editorial” da Folha afirma que passar os Correios para a iniciativa privada seria a única forma de “aumentar a eficiência e modernizar a Empresa”. Pois bem. Temos dois casos que mostram que o lucro é o único objetivo da iniciativa privada: Mariana e Brumadinho. A questão das barragens que não resistiram ao acúmulo de rejeitos são um exemplo de que não se trata de eficiência e sim de lucrar a qualquer preço. Não existe um cálculo social na iniciativa privada.

Os Correios são hoje uma empresa que tem um braço logístico que nenhuma outra possui. Nós trabalhadores, por sua vez, temos direitos conquistadas por lutas de décadas. O mercado de logística privado está se expandindo porque se utiliza de mão de obra quase totalmente pejotizada. O conglomerado a qual o jornal Folha de S. Paulo integra possui uma empresa de logística. A ela interessa exterminar uma empresa que mantém direitos trabalhistas. Ou seja, o que realmente está acontecendo é a velha luta de classes. Infelizmente, as grandes centrais sindicais se preocupam com a manutenção da governabilidade de Lula e deixaram pautas históricas de lado. O fato de não se questionar a reforma Trabalhista tem permitido o avanço, cada vez maior, da pejotização, base da expansão das diversas players no Brasil como Amazon, Mercado Livre, Shopee, etc.

2) Os argumentos da Folha são os mesmos utilizados para defender a privatização da CEEE Equatorial aqui no estado do Rio Grande do Sul, responsável por sucessivos apagões. É possível desconstruir este discurso sabendo que a população hoje percebe a precarização dos Correios ?
Moisés Marinho – Suplente do Secretário Geral 

A privatização vai gerar tarifas altas e muitos municípios e regiões carentes ficarão sem entregas e assistência postal. Isso porque hoje os Correios praticam o subsídio cruzado, ou seja, o lucro produzido pelas cidades maiores e mais ricas (7% das cidades) subsidiam o custo do serviço dos Correios nas cidades menores e carentes. Os Correios têm capilaridade nacional e extenso histórico de relevantes serviços sociais prestados. 100% de sua logística é pública e auto sustentável.

Além de demonstrar que os serviços ficarão mais caros, precisamos esclarecer a população. A culpa da atual crise dos Correios não é dos trabalhadores. A recuperação da Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos (ECT) começa pela devolução da grana tomada pela União no valor de R$ 250 milhões, a título de ‘dividendos’. Devemos impedir os conchavos espúrios, garantindo que a presidência da empresa seja realizada por funcionário com matrícula ativa, eleito pelos próprios funcionários, sem ingerência externa. A ECT é pública, competitiva e com condições de voltar a dar lucro se houver gestão comprometida e sem intervenção política de governos que atuam em função de interesses privados. Também precisamos demonstrar a hipocrisia da extrema direita que aprovou no Senado uma proposta de fiscalização e controle, uma espécie de ‘mini-CPI‘. Desde quando o Congresso, antro de corruptos e fisiológicos, tem moral para fiscalizar qualquer estatal ? Querem sim é agradar o apetite das multinacionais e aumentar a distribuição de cargos para o Centrão.

3) A atual administração dos Correios lançou um ‘Plano estratégico de trabalho’ com o objetivo de economizar R$1,5 bilhões. Na verdade é uma reestruturação que precariza ainda mais a empresa, com o fechamento de agências por todo o país. E Rui Costa – Ministro da Casa Civil de Lula – está exigindo ainda mais cortes, envolvendo inclusive demissões de trabalhadores. É possível garantir os investimentos necessários para tirar os Correios da atual crise mantendo o Arcabouço Fiscal?
Helen Pinho – Secretaria da Mulher

Não é possível. Essa conclusão expõe dois grandes problemas do governo Lula/Alckmin. Por um lado, a falta de planejamento de Estado para as empresas públicas; por outro, a natureza do Arcabouço Fiscal que é a mesma do Teto de Gastos do ex-presidente Michel Temer, mas com maquiagem. Sem haver um projeto de Estado para as empresas públicas só nos resta o Arcabouço Fiscal, que não nos entregará nada mais do que cortes orçamentários e desinvestimentos.

4) Expliquem o que gerou o déficit de R$ 4,4, bilhões no primeiro semestre. Qual a responsabilidade dos governos Bolsonaro e Lula?
Paulo da Silva – Secretário da Subsede de Santa Cruz

Viemos em uma sucessão de ataques. Em particular, durante o governo Bolsonaro, em que a empresa esteve a beira de ser vendida, através do Projeto de Lei (PL) – 591. Para justificar a privatização, houve uma ampla campanha de fake news e um amplo sucateamento. Com a derrota de Bolsonaro, o PL-591 foi arquivado, mas o governo Lula segue sem investimentos, segue precarizando e sem qualquer projeto coerente. Tampouco adota alguma medida que enfrente esta concorrência desleal das empresas do e-comerce que não pagam nenhum direito trabalhista.

Emerson Saes – Secretário subsedes

A questão mais importante, no governo Lula, é que apesar de se declarar contra a privatização, adota uma política econômica – equação de arcabouço fiscal mais déficit zero – que impacta todas as estatais, e em particular os Correios. Além disso, houve a chamada ‘PEC das Blusinhas’, votada pelo Congresso Nacional com o lobby do setor varejista e com apoio do governo, visando o aumento de arrecadação. E, também, a Portaria Interministerial nº 1086/2024, que liberou que empresas de logística do e-comerce passassem a atuar nas encomendas internacionais. O que antes era exclusividade dos Correios, passou a ser abocanhado por grandes multinacionais, principalmente chinesas.

Resumindo, o governo Lula agrada o mercado fazendo economia nos gastos primários, deixando de fora os outros gastos não primários como juros da dívida e isenções de impostos de bilhões por ano as grandes empresas, e descapitaliza os Correios em nome de aumento de arrecadação. Na verdade, para o ministério da Economia, que dirige os rumos do país, os Correios não tem importância alguma, sacrifica sua estatal em nome de estar bem com o mercado e da governabilidade.

5) Ao longo das últimas décadas os Correios tem sido colocado numa lógica de empresa que tem que ser lucrativa e competitiva, preparando o terreno para sua privatização. Qual o papel que você acha que deve cumprir os Correios no Brasil? Você acha que a União deve deixar a empresa à mercê do mercado?
Alexandre dos Santos Nunes – Secretário Geral

Uma empresa pública tem a obrigação de ser socialmente lucrativa.  E há muitíssimas demandas que podem e devem ser supridas pelos Correios. Hoje já prestamos inúmeros serviços nas agências. Nos momentos de crise, toda a estrutura dos Correios foi fundamental. Seja nas campanhas de vacinação durante a pandemia Covid-19, seja no atendimento as vitimas da fraude do INSS. Foram os trabalhadores e a estrutura dos Correios os responsáveis por levar auxílios como mantimentos aos desabrigados das enchentes do Rio Grande do Sul e de Minas Gerais.

Evidente que é impossível os Correios se restringirem a prestação de serviços postais. A atual administração afirma que 85% das agências operam no vermelho. Isso acontece porque o monopólio dos correios se mantém apenas no setor menos rentável, que é a correspondência. E sabemos que é impossível disputar, de igual para igual, com empresas gigantes e inclusive multinacionais sem nos submeter a um nível ainda maior de ataque e precarização. Por isso, a  exigência que fazemos ao presidente Lula é que, para ser coerente com a defesa dos Correios públicos, precisa investir recursos, contratar funcionários, defender o monopólio não só postal, mas também do e-commerce, acabar com a pejotização, que é a base do lucro e exploração das gigantes de entregas e e-comerce.

Isso só acontecerá se os grandes Sindicatos – não somente de Correios – mas as grandes centrais sindicais abandonarem sua estratégia de base de apoio ao governo Lula e colocarem uma ampla campanha, nas ruas, enfrentando o discurso da extrema direita, do mercado, do Congresso, mas também a política econômica do governo Lula. Este é o chamado que nós fazemos.

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