Ao contrário do que diz a ultradireita, megaempresários não são heróis. São o problema
Das fakenews na tragédia do Rio Grande do Sul ao negacionismo climático: ultradireita e agrobilionários andam de braços dados
Nós somos parte daqueles que afirmam que é correto politizar o debate sobre a atual tragédia que estamos vivendo no Rio Grande do Sul. Mas não para dizer meramente que a culpa é de um governo específico, com objetivos eleitoreiros. Mas porque, ao não politizarmos, estaríamos ajudando a isentar os chefes de Estado que sim, fizeram opções de com quem e para quem governar. Estaríamos ajudando a perpetrar que “novos Maios” voltem a ocorrer.
De fato, “o Estado” administrado pelas 3 esferas dos governos, não só pelo governador Eduardo Leite ou pelo prefeito Sebastião Melo, mas inclusive, por Lula, não investiram recursos na prevenção contra os efeitos dos eventos climáticos que eram previsíveis e são, portanto, corresponsáveis da tragédia que estamos vivendo. Dos 497 municípios do estado, somente 140 tinham prevenção a enchentes, enxurradas e inundações contempladas nos seus planos diretor, segundo o IBGE (dados de 2021). Apenas 20 municípios tinham legislação sobre mitigação dos efeitos das mudanças climáticas.
Mas também são imensamente responsáveis os setores empresariais que fazem lobby para aprovar leis do seu interesse, e que estão por trás da passagem da boiada, no Congresso Nacional e na Assembleia Legislativa. O argumento de sempre é que a legislação ambiental atrapalha o “desenvolvimento econômico” e negam descaradamente os dados sobre o aquecimento global ou sobre desmatamento no Brasil.
A ultradireita, que não é boba, está cavando seu espaço. Se utiliza da legítima indignação contra os governos, que se demonstraram incapazes, inclusive de garantir o resgate das pessoas durante as enchentes e enxurradas – para disseminar uma falsa ideia – que o setor público é omisso e quem está socorrendo o povo são os empresários. Como já era esperado, preservam, nestas denúncias, o prefeito de Porto Alegre, Sebastião Melo, por ser este um declarado bolsonarista.
Neste sentido Dunga, ex-técnico de futebol, divulgou um vídeo afirmando que não se estava permitindo a distribuição de alimentos porque seria necessário um “nutricionista para supervisionar.” Ou de que as “autoridades” exigem documentação para pilotar bote de resgate.
Ou uma “influencer” fundamentalista neopentecostal que afirmou que a culpa da tragédia é porque o Rio Grande do Sul é o estado que concentra a maior quantidade de “terreiros de macumba” e, por isto, o que vivemos é um castigo de Deus.
Mas, acima de tudo, a narrativa da ultradireita tem um objetivo – destacar que o “Estado” é ineficiente (porque é burocrático) e que o “livre-comércio” e sua maior expressão, os empresários, são os salvadores da pátria. Por isto viralizam vídeos do “véio da Havan”, ou das grandes empresas do agronegócio do estado, que estariam realizando filantropia enviando água e alimentos para o povo gaúcho. Para eles, os salvadores são os mesmos que negam o aquecimento global, os que poluem, desmatam e que utilizam trabalho escravo. E que, diga-se de passagem, controlam o Estado burguês junto com os demais setores capitalistas. Ou seja, querem transformar os vilões em vítima.
As ideologias cumprem a função de conduzir à falsa compreensão da realidade. Por isto é muito importante nós disputarmos, com intensidade, as ideias que estão sendo disseminadas por vários setores, neste momento de crise.
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É fato que o principal responsável pelas mudanças climáticas é o aumento potencial de combustíveis fósseis. Mas, no caso do Brasil e, particularmente do estado do Rio Grande Sul, em função da reprimarização da nossa economia, a agroindústria e todas as grandes empresas do agronegócio são as principais responsáveis por aprofundar o desequilíbrio ambiental. As emissões de carbono na agropecuária subiram 17% nos últimos 30 anos. As grandes empresas são as principais responsáveis pelo desmatamento de florestas para uso da área em lavouras e pastos, seguido pela emissão de metano pelos bovinos. As grandes empresas do agro são as responsáveis pela captação de água para irrigação em grande escala, e sem outorgas e fiscalização, pelo assoreamento de rios e riachos naturais, e a destruição de fontes e banhados por atividades econômicas de monoculturas extensivas. A pressão por devastar ainda mais áreas florestais para dar lugar a plantações de monocultura, além da contaminação do solo por fertilizantes para acelerar a colheita.
Este discurso da ultradireita é fortalecido pela grande imprensa, que fala particularmente das perdas, neste momento, para o agronegócio. Ou até mesmo do governo Lula que não apenas elogia, como destaca que “nunca antes na história deste país” houve um Plano Safra 2023/2024 de R$ 364,22 bilhões. E este setor está reivindicando ser a prioridade na liberação dos recursos por conta da tragédia do estado. E você sabia que estes recursos não vão para a pequena agricultura familiar, mas, especialmente, para os grandes produtores rurais, sem que, em nenhum momento, exista qualquer exigência, para que estas grandes indústrias cumpram a legislação ambiental? Ou de que grande parte do agronegócio do nosso estado é de propriedade estrangeira, e que, portanto, há grandes pagamentos de dividendos e juros indo para o exterior, financiando a desnacionalização do campo e os lucros de grandes empresas e banqueiros estrangeiros?
Ou seja, não se trata de simplificar a realidade para encontrar vilões. Os números falam por si. No ranking da Forbes de 2023 há 61 agro-bilionários no nosso país, donos de uma fortuna pessoal de R$ 196,2 bilhões
Os agro-bilionários do Rio Grande do Sul não necessitam de socorro. Quem necessita são os milhares de trabalhadores que perderam suas casas, são os pequenos proprietários rurais. E mais, nós defendemos uma reforma agrária profunda, que redistribua a terra, expropriando todos os latifúndios, sem indenização, apoiando a agricultura familiar e camponesa, preservando a natureza, com demarcação de todas as terras indígenas e quilombolas, a nacionalização e estatização, sob controle dos trabalhadores, do agronegócio, sem indenização aos latifundiários e uma completa reestruturação das políticas de crédito e comercialização agrícola, voltada às necessidade do povo, em harmonia com a natureza, e não esse sistema de devastação ambiental voltado à acumulação de capital por um ínfimo punhado de agro-bilionários e suas megas empresas monopolistas .
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