Belém: Greve operária derrota grandes construtoras e revela o falso legado da COP30

No lugar dos carros, as ruas de Belém, com seus túneis de mangueiras, passaram a ser ocupadas diariamente por operários e operárias da construção civil em grandes passeatas desde o dia 16 de setembro, quando teve início a greve da categoria, encerrada na quarta-feira, dia 24.
A capital do Pará está cheia de obras para a realização da XXX Conferência das Partes (COP) das Organizações das Nações Unidas (ONU), voltada ao debate sobre mudanças climáticas. As verbas disponibilizadas pelos governos federal e estadual ao setor da construção civil somam quase R$ 5 bilhões. Os empresários estão lucrando como nunca. E querem lucrar ainda mais, explorando o máximo possível a força de trabalho de operários e operárias.
Em meio a esse derrame de dinheiro realizado pelo presidente Lula (PT) e pelo governador do Pará, Helder Barbalho (MDB), os empresários apresentaram uma proposta de reajuste salarial de 5,5% sobre o piso salarial e R$ 10 de aumento na cesta básica.
“Uma proposta vergonhosa, um grande desrespeito com os operários e operárias que estão trabalhando dia e noite para que as obras da COP30 sejam finalizadas a tempo. Uma miséria de reajuste frente aos milhões de lucros que estão obtendo. Esse percentual significava R$ 5 de aumento no salário dos serventes. Frente a isso, nossa resposta foi a greve”, afirmou Aurinor Gama, coordenador-geral do Sindicato dos Trabalhadores na Indústria da Construção Civil e do Mobiliário de Belém (STICMB), filiado à CSP-Conlutas, e militante do PSTU.
Vitória
Greve arranca conquista nas pautas econômicas e sociais

Operários e operárias da construção civil, em greve, realizam protesto nas ruas de Belém
Patronal foi obrigada a conceder aumento real nos salários, reajustar o valor da cesta básica, pagar PLR e garantir a classificação para as mulheres
Mesmo com toda a pressão realizada pelos empresários, ameaças de corte de ponto e demissão, repressão do aparato policial, a categoria saiu vitoriosa.
“Arrancamos aumento real de 1,37% nos salários, garantindo um reajuste total de 6,5%, quando a patronal queria dar 5,13%. A cesta básica teve um aumento de R$ 50, a proposta inicial dos empresários era um aumento de R$ 10. Conseguimos o pagamento de R$ 350 referente a participação nos lucros e resultados (PLR). Além disso, conseguimos uma conquista histórica para as mulheres. As operárias que estiverem trabalhando na ferramenta, diferente da função de servente, terão quatro meses para serem classificadas”, destacou o coordenador-geral do sindicato.
“A categoria saiu da greve fortalecida com o clima de vitória. Agradecemos todo o apoio e solidariedade que recebemos. A população de Belém estava do nosso lado. Diversos sindicatos e ativistas do Pará e de várias partes do Brasil emitiram seu apoio. A greve ganhou repercussão na imprensa internacional. Tudo isso ajudou a forçar a patronal a recuar e aceitar a negociação com o sindicato. Eles sentiram a força da greve. Foram nove dias de piquetes e passeatas pelas ruas de Belém”, disse Aurinor Gama.
Só piora
Concentração de riqueza nas mãos de poucos, pobreza nas mãos de muitos

Obras no parque da cidade em Belém Foto Ricardo Stuckert PR
A greve dos operários e operárias da construção civil desmascara o discurso mentiroso do governador Helder Barbalho de que a COP30 vai deixar um grande legado para a população de Belém. O que tem avançado é a concentração de riqueza nas mãos de uma minoria de empresários, entre eles os da construção civil, com grandes obras que não atendem aos interesses da classe trabalhadora, aprofundam as contradições e geram mais exclusão social.
Despejos e mais desigualdade social
As poucas obras que foram realizadas na periferia da cidade, como a macrodrenagem das bacias do Tucunduba e Una e dos canais do Caraparu e Murutucu, viraram pesadelo para diversas famílias que foram despejadas à força. Várias residências foram demolidas, e as indenizações não são suficientes para comprar outro imóvel nas redondezas.
Famílias são forçadas a buscar moradia em locais distantes do centro, com as mesmas precariedades de antes e sem condições dignas. De acordo com o levantamento do InfoAmazônia, estima-se que 500 famílias foram desalojadas com indenizações entre R$ 5 mil e R$ 40 mil.
Já a comunidade da Vila da Barca foi transformada em um depósito de esgoto e dejetos da avenida Doca de Souza Franco, área nobre, onde o metro quadrado é um dos mais caros de Belém. Esse tema ganhou destaque na imprensa nacional, contudo o governo seguiu com a obra. O que antes seria uma praça, agora será uma Estação Elevatória de Esgoto para receber os dejetos dos ricos.
Todas essas obras geram lucro para os empresários da construção, que também estão ganhando muito dinheiro com a construção de prédios mobiliários, que são grandes vitrines que escancaram a desigualdade social na capital paraense.
Festa do capital imobiliário
A construtora Quadra Engenharia colocou à venda apartamentos de luxo pelo valor de R$ 18 milhões conforme noticiado pela revista Isto É. Enquanto isso, a realidade de operárias e operários é de muita exploração e baixos salários, sendo que são eles que constroem esses prédios.
Um pedreiro, com salário médio atual de R$ 2.063,34, teria que trabalhar 726 anos para acumular o valor de um desses imóveis. Já um servente, recebendo em média R$ 1.518,00, precisaria trabalhar 988 anos para ter acesso ao mesmo apartamento.
Esses números absurdos mostram que a riqueza produzida pela classe trabalhadora está concentrada nas mãos de uma minoria, enquanto quem constrói os prédios mal consegue garantir condições dignas de vida. É contra essa realidade, fruto do sistema capitalista, que a greve operária revela ao mundo e a afronta nas ruas de Belém.
Capitalismo verde não existe
COP30 é balcão de negócios dos capitalistas
Tudo isso mostra que a COP30 é mais uma farsa capitalista. Enquanto a catástrofe climática se aprofunda, os mesmos países e corporações capitalistas que devoram o planeta se reúnem em cenários luxuosos para fingir que fazem alguma coisa. A preparação do evento já é um escândalo: milhões desviados para enriquecer a patronal local, com obras que exploram trabalhadores e massacram comunidades. Os governos, coniventes, mostram sua verdadeira face ao garantir os lucros dos de sempre enquanto o povo sofre.
Não se engane: a COP30 não vai resolver nada. É um palco para os capitalistas maquiarem sua destruição com discursos vazios de sustentabilidade e muito greenwashing, uma estratégia de marketing enganosa. Os acordos climáticos são inócuos, enquanto avançam o desmatamento, a poluição e a queima de combustíveis fósseis. É o jogo cruel do capital verde, que transforma até a ameaça de extinção em oportunidade de negócio. Enquanto o lucro for o motor do mundo, a verdadeira justiça climática será impossível.
Direção
O papel revolucionário do PSTU e da LIT-QI na greve
O PSTU e a Liga Internacional dos Trabalhadores – Quarta Internacional estiveram presentes todos os dias na greve, ombro a ombro com operários e operárias da construção civil de Belém. Os militantes do partido, que integram a diretoria do sindicato, conduziram a luta, a partir de cada canteiro de obra, junto com a categoria.
“O PSTU tem um histórico trabalho junto aos operários e operárias da construção civil de Belém. A categoria reconhece a presença e o apoio do partido nas suas lutas. Essa relação é construída diariamente dentro das obras, nas batalhas diárias”, ressaltou Cleber Rabelo, diretor do sindicato e militante do PSTU.
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“O PSTU tem uma relação forte com a classe operária brasileira. Enxergamos o papel central que a classe operária cumpre dentro do sistema capitalista, como força motriz e também como força revolucionária para derrotar esse sistema opressor e explorador. É essa força que colocamos em ação nas ruas, no embate contra a patronal. Não foi apenas uma luta econômica, travamos uma luta política, um embate direto de luta de classes. Nessa luta, o PSTU está ao lado dos operários e das operárias”, completou.
“A vitória que obtivemos é parte da combinação da presença de uma direção revolucionária e socialista à frente do sindicato, que construiu a greve apoiada na base, dialogando em cada obra, disputando a consciência da categoria de que era hora de irmos ao embate. Isso foi só uma pequena mostra de que, quando a classe se junta a uma direção consequente e combativa, ninguém segura”, finalizou Cleber Rabelo.