Rio de Janeiro

Cláudio Castro e Eduardo Paes se unem para atacar os pretos e pobres das favelas

Cyro Garcia, Presidente do PSTU-RJ

9 de abril de 2025
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Familiares de vítimas de violência policial pedem justiça na cidade do Rio de Janeiro | Foto: Tânia Rêgo/Agência Brasil

Após seis anos de tramitação, enfim foi concluído o julgamento da Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 365 ou ADPF das Favelas como ela ficou conhecida após liminar concedida pelo ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Edson Fachin, em 2020, visando a diminuição da letalidade policial no estado do Rio de Janeiro. Dentre outras questões, a liminar proibia o uso de helicópteros nas operações policiais e a utilização de escolas ou postos de saúde como base para as operações militares. O objetivo da liminar era impor limites às operações policiais nas favelas, onde os mais elementares direitos dos cidadãos são sistematicamente violados.

“Estado democrático de direito” nas favelas e periferias é uma abstração, pois a política de segurança que é implementada no país é de criminalização da pobreza e de prática de um verdadeiro genocídio ao povo negro nas favelas, em particular a juventude negra. Mesmo assim, a liminar continha algumas medidas que preservavam minimamente os direitos humanos dos moradores das favelas e periferias. Apesar das reiteradas falas do governador do Cláudio Castro (PL) criticando a liminar por engessar a atuação da polícia nas favelas, as operações nunca deixaram de ser realizadas e todos se recordam que no ano passado, durante dias e dias, as escolas públicas da Maré ficaram fechadas por conta de uma operação policial prolongada naquele território.

Apesar da utilização de helicópteros estarem proibidas pela liminar, recentemente um agente policial foi morto atingido por uma bala quando estava pilotando um helicóptero em uma operação policial. Inúmeras foram as escolas públicas que ficaram fechadas ao longo de todos esses anos por dias e dias por conta de operações policiais. Então, dizer que a liminar criava obstáculos para a atuação da polícia é uma grande falácia. Porém, é inegável que a eliminar era um elemento institucional que minimamente dava parâmetros para a ação policial em base aos direitos humanos dos moradores das favelas e periferias e, isto por si só, era um incômodo, já que a cada vez que acontecia uma operação policial os agentes sabiam que de alguma forma estavam agindo de maneira inconstitucional, pois foi esse o termo utilizado pelo ministro Edson Fachin ao caracterizar as operações policiais no estado do Rio de Janeiro, quando da elaboração da liminar.

Fachin dizia que a atuação da polícia do Rio de Janeiro era uma atuação inconstitucional. Isto acabou acarretando uma diminuição da letalidade policial, mas para nada a atuação da polícia nesse período se pautou pelo respeito aos direitos dos moradores das favelas. A violência nas operações policiais continuou, a entrada na favela atirando e depois dando falsas justificativas de que foram recebidos a tiros ou que apenas revidaram os tiros de traficantes, versões inúmeras vezes denunciadas pelos moradores como  inverídicas, as abordagens humilhantes aos trabalhadores, o desrespeitos às escolas e aos postos de saúde públicos, as balas perdidas que sempre encontram corpos negros de pessoas inocentes, e que são encaradas como efeitos colaterais, nada disso cessou com a liminar.

A liminar estava em vigor e, portanto, os agentes policiais de uma certa forma tentavam estabelecer um mínimo autocontrole. A liminar estabelecia que a atuação da polícia tinha de se basear nos direitos humanos para proteger os moradores das favelas, se contrapondo à ideologia de que base prática são para defender bandidos. Porém, com a votação unânime do STF, mesmo essas medidas da liminar de Fachin, que eram absolutamente insuficientes, deixam de existir. Os helicópteros poderão ser utilizados nas operações policiais e não existe restrição territorial, incluindo aí as escolas e postos públicos de saúde, que poderão inclusive ser invadido pela polícia, caso ela veja como necessário.

Outro retrocesso foi a permanência em serviço de policiais nas operações que tivessem envolvimento em mais de dois óbitos, ficando a critério de parâmetros a serem estabelecidos subjetivamente pelas próprias corporações policiais seu afastamento ou não.  Foi mantido a necessidade do uso de câmeras corporais e a necessidade da utilização de câmeras também nas viaturas policiais. O controle externo vai se dar pelo Ministério Público Estadual e, também, quando houver óbito, o Ministério Público deverá ser comunicado obrigatoriamente e deverá ser realizado autópsia, além da preservação da cena do crime.

Ainda que seja público e notório a chegada muitas vezes de cadáveres nos hospitais públicos do Rio de Janeiro sendo levados pela própria polícia para um suposto “socorro”, mas todas as pessoas sabem que essas pessoas já chegam mortas nos hospitais como forma de destruir a preservação de cenas dos crime. É importante registrar aqui que no lobby para derrubada da liminar de Fachin e a obtenção do novo consenso jogaram um papel muito importante tanto o governador Cláudio Castro quanto o prefeito da cidade do Rio de Janeiro, Eduardo Paes (PSD), este cada vez mais preocupado em tomar atitudes visando sua candidatura a governador em 2026. Ele sabe que a questão da segurança é um ponto nevrálgico na realidade do país e não é por outro motivo que ele está imbuído de aprovar um projeto visando o armamento da Guarda Municipal do Rio de Janeiro, visando fechar o flanco da extrema direita.

A bem da verdade, essa questão não é apenas do Eduardo Paes e da extrema direita ou de Cláudio Castro. Na cidade de Maricá, o prefeito Washington Quaquá (PT) está criando uma guarda municipal armada, inclusive com blindados, para, segundo suas palavras, “botar a bandidagem na vala”.

Infelizmente, prevalece a visão de uma política de segurança que criminaliza a pobreza através da falaciosa “guerra às drogas”. Política que representa um enxugar de gelo implementada por governos da extrema direita, mas também por governos do próprio PT, como no caso da Bahia,  que promove um verdadeiro genocídio ao povo negro em nossas favelas e periferias.

De nossa parte defendemos que para resolver o problema da segurança pública, precisamos modificar radicalmente a forma como esse debate é encarado. Primeiramente, defendemos a descriminalização das drogas, pois a droga é uma questão de saúde pública e não de segurança pública.

Defendemos também a desmilitarização das PMs, criando uma só polícia civil com uma parte fardada, voltada para o policiamento ostensivo, e outra à paisana, voltada para o serviço de inteligência, com direito de sindicalização, direito de greve, com remuneração justa a fim de inibir a corrupção.

Defendemos a demissão imediata de todos os agentes envolvidos em crimes de corrupção ou de inobservância de direitos humanos; votação para a eleição de de delegados, para que haja uma aproximação entre a polícia e as comunidades; que a polícia se imponha pelo respeito aos direitos humanos e não pela intimidação. E, além disso, defendemos a autodefesa dos moradores das comunidades para se defenderem da opressão do das milícias, do tráfico e da violência policial.

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