Meio ambiente

Diga não! PEC quer privatizar praias brasileiras

Jeferson Choma

6 de junho de 2024
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Foto Tânia Rego/Agência Brasil

Sim, a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 03/2022 quer abrir as portas para a privatização das praias brasileiras. A PEC, que já foi aprovada na Câmara dos Deputados, agora se encontra na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado e tem como relator ninguém mais, ninguém menos que Flávio Bolsonaro (PL). Nos últimos dias, a polêmica em torno da PEC gerou troca de farpas até entre o jogador Neymar e a atriz Luana Piovani.

A emenda quer modificar artigos da Constituição Federal que dispõem sobre áreas da União no litoral. Pela Constituição, essas áreas são terrenos de Marinha e correspondem a faixas na costa marítima que foram definidas com base a uma linha imaginária da maré alta, do ano de 1831. Ela se estende por 33 metros em direção à terra firme. Ou seja, esses terrenos não abrangem a praia, mas sua privatização limitaria o acesso dos banhistas.

Um baú de tesouros para a especulação imobiliária

Hoje, quem ocupa esses terrenos podem ocupá-las e até passar para seus herdeiros ou terceiros, mas precisam pagar um tributo específico á União.

Os bolsonaristas e defensores do projeto afirmam que apenas querem acabar com esse tributo. Mas, isto é mentira. Se fosse assim, bastaria uma simples lei para acabar com a taxação. Na verdade, eles estão de olho nessas áreas públicas, para privatizá-las. O objetivo é colocá-las à disposição de mega empreendimentos imobiliários. E o baú do tesouro é muito grande. Segundo levantamento da Secretaria de Patrimônio da União (SPU), atualmente existem 521 mil propriedades cadastradas em áreas de Marinha.

Armadilhas para privatizar praias

A PEC prevê que a União fará a “cessão onerosa” dessas áreas. Ou seja, seus ocupantes serão obrigados a comprar o terreno. Em outras palavras, os lotes deixariam de ser da União e teriam apenas um dono, como um hotel ou resort.

Esses agentes devem estar inscritos “no órgão de gestão do patrimônio da União” até a data de publicação do texto e o projeto abre uma margem enorme para fraudes e grilagens de terras. Comunidades inteiras que ocupam esses terrenos podem ser expropriadas através fraudes cartoriais, corrupção de funcionários públicos e ações da justiça e da polícia em prol de empresários, dos projetos de ocupação e dos especuladores imobiliários.

O projeto também quer transferir para os estados e municípios as áreas que são usadas por eles ou mesmo as áreas não ocupadas, que podem ser requeridas para a expansão do perímetro urbano, mediante modificações dos planos diretores, que são aprovados pelas Câmaras Municipais.

Traduzindo: terrenos da União passarão para os municípios e ficarão à mercê da atuação do fortíssimo lobby imobiliário, que sempre interfere nos planos diretores dos municípios, corrompendo prefeitos e vereadores, e, desse modo, poderá abocanhá-los para fins de especulação imobiliária, construção de condomínios e resorts turísticos.

“Nova Cancún” ameaça meio ambiente

Mesmo os terrenos passados para a propriedade dos estados poderão enfrentar essa mesma situação. Não por acaso, a PEC avaliada pelo Senado é chamada de “PEC Nova Cancún”, em referência ao modelo absolutamente predatório de turismo da cidade de Cancún, no México, conhecida por ter resorts com praias paradisíacas, mas particulares. “Me ajudem a fazer da Baía de Angra uma Cancún brasileira. Só que eu tenho que derrubar um decreto, acreditem, é por lei”, defendeu Jair Bolsonaro, então presidente do país, em 27 de julho de 2019.

Ambientalistas também apontam que o texto dá margem para a criação de praias privadas, além de promover riscos para a biodiversidade. Uma nota técnica do Grupo de Trabalho para Uso e Conservação Marinha, da Frente Parlamentar Ambientalista do Congresso Nacional, afirma que a proposta, que parece ser um simples ato administrativo para desonerar o uso destas áreas, representa uma “grave ameaça ambiental às praias, ilhas, margens de rios, lagoas e mangues brasileiros e um aval para a indústria imobiliária degradar, além de expulsar comunidades tradicionais de seus territórios”.

Ponta do Iceberg

PEC é parte do “Pacote da Destruição”

A PEC é mais um projeto do “Pacote da Destruição” que está na pauta do Congresso Nacional. Estamos falando de 24 projetos de lei e três emendas à Constituição que tramitam no Congresso brasileiro, com alta probabilidade de avanço imediato, e que afetam direitos consagrados em temas como licenciamento ambiental, grilagem, direitos indígenas e financiamento da política ambiental.

Há, ainda, outros projetos que flexibilizam o Código Florestal, as legislações sobre recursos hídricos, mineração em Unidades de Conservação, oceano e zonas costeiras, sendo que alguns podem ser aprovados a qualquer momento.

Todo esse conjunto de medidas é defendido pela Bancada Ruralista e só pode ser detido pela mobilização direta dos trabalhadores e das comunidades ameaçadas. A Bancada Ruralista, o agronegócio e os grandes capitalistas não diminuíram seu apetite, mesmo depois da catástrofe climática que o Rio Grande do Sul sofre. Vão continuar sua cruzada para destruir o meio ambiente, mesmo que isso represente uma ameaça para a maioria da humanidade.