Entre a COP 30 e os trilhos imperialistas: Como EUA e China disputam o Brasil às custas do meio ambiente
O Brasil da COP30 e a contradição ambiental
O Brasil é o centro das atenções do mundo nesse mês de novembro, sede da COP 30, a conferência global do clima. O evento, que pretende reafirmar compromissos ambientais, acontecerá ao mesmo tempo em que o próprio país aprofunda projetos que ameaçam diretamente seus biomas. Sob interesses de potências como Estados Unidos e China, e com a conivência do Governo Federal, grandes obras de infraestrutura seguem avançando sobre a Amazônia e o Cerrado em nome do “progresso verde”.
A contradição é evidente: enquanto o país tenta se apresentar como liderança ambiental, sua política econômica continua orientada pela lógica exportadora de commodities que devasta florestas, rios e comunidades tradicionais. Essa contradição ganha forma concreta nas duas grandes ferrovias planejadas, a Ferrogrão e a Ferrovia Bioceânica, que são expressão de uma disputa imperialista que coloca o meio ambiente brasileiro como moeda de troca.
Ferrovias da dependência
A Ferrogrão, projeto de mais de R$ 20 bilhões, ligará o norte de Mato Grosso ao porto de Miritituba, no Pará. Sua função é explícita: escoar grãos produzidos pelo agronegócio para exportação. O governo e o setor privado anunciam ganhos de eficiência e redução de emissões de carbono, mas por trás dos números está o fortalecimento de um modelo que destrói ecossistemas inteiros. O traçado corta o Parque Nacional do Jamanxim, afeta terras indígenas Munduruku e abre caminho para mais desmatamento e grilagem.
A Ferrovia Bioceânica, por sua vez, é o grande projeto de influência chinesa na América do Sul. Com cerca de 3.000 km e investimentos estimados entre R$ 40 e R$ 100 bilhões, pretende ligar o porto de Santos ao litoral do Peru, integrando o continente ao projeto chinês da “Nova Rota da Seda”. Por trás do discurso de integração continental está o objetivo de garantir o escoamento de minérios e grãos sul-americanos diretamente para o mercado asiático.
Essas ferrovias não foram pensadas para o transporte de pessoas nem para fortalecer a economia interna. São corredores de exportação, artérias que alimentam o agronegócio, a mineração e as cadeias globais controladas por capitais estrangeiros. E enquanto o Estado brasileiro se orgulha de atrair investimentos, o que se aprofunda, caso estes projetos se concretizem, é a dependência. O país oferece terra, energia e isenções fiscais; as potências recolhem lucros e influência política.
O meio ambiente como campo de disputa
Os impactos ambientais são tratados como custo colateral do “desenvolvimento”. O licenciamento da Ferrogrão, segundo o Ibama, ainda está em fase de estudo técnico, mas enfrenta pressões políticas e econômicas para ser aprovado. O traçado da ferrovia ameaça diretamente áreas de floresta primária, margens de rios e territórios protegidos. Ao mesmo tempo, a realização das obras estimula o aumento de queimadas e a abertura de novas rotas ilegais de exploração de madeira e mineração.
A retórica oficial tenta justificar os projetos em nome da eficiência ambiental. Argumenta-se que o transporte ferroviário emite menos gases de efeito estufa que o rodoviário. É verdade, mas o que se transporta é justamente a base do problema: commodities produzidas às custas da destruição do bioma amazônico e do Cerrado. Reduzir emissões no frete não torna sustentável um modelo que continua empurrando o desmatamento para novas fronteiras agrícolas.
No caso da ferrovia bioceânica, o impacto ambiental é igualmente preocupante. O traçado atravessará o Pantanal, os Andes e áreas de alta sensibilidade ecológica, alterando cursos de rios e pressionando ecossistemas frágeis. Especialistas alertam que o projeto pode causar danos irreversíveis à fauna e à flora, e ainda ampliar o risco de deslocamento forçado de comunidades tradicionais.
Os interesses sujos das potências imperialistas
Tanto os Estados Unidos quanto a China disputam o controle dessas rotas e dos contratos bilionários de infraestrutura. Os EUA, antes sob o discurso de “proteger a Amazônia”, agora com a política negacionista de Trump, pressionam o governo brasileiro a manter alinhamento político e comercial, enquanto tentam conter o avanço chinês no continente. Já a China, com sua política de investimento em larga escala, se apresenta como parceira “solidária” do desenvolvimento, mas sua presença tem ampliado a dependência tecnológica e financeira do Brasil.
A disputa entre as duas potências nunca foi pela preservação ambiental, mas pelo domínio dos fluxos de mercadorias e recursos naturais. No meio, o governo brasileiro tenta equilibrar-se entre os dois polos, mas acaba servindo a ambos. O resultado é um país que fala em transição energética e compromisso climático, enquanto aprova megaprojetos que aumentam as emissões, aceleram o desmatamento e concentram riqueza.
A subserviência do Governo Lula
O governo Lula mantém uma relação de subserviência com os grandes projetos de ferrovias e com as potências imperialistas que disputam influência sobre o Brasil. Apesar do governo buscar projetar a imagem de liderança ambiental no cenário internacional e reforçar o discurso de transição verde, o que observamos na prática é o apoio e a tentativa de viabilizar obras como a Ferrogrão e a Ferrovia Bioceânica, que aprofundam a dependência econômica e ambiental.
Na prática, Lula tenta equilibrar-se entre os Estados Unidos e a China. Trump pressiona o governo brasileiro a se manter politicamente alinhado e a conter o avanço chinês na América do Sul. Já Pequim oferece investimentos vultosos, financiando obras de infraestrutura e integrando o Brasil ao projeto da Nova Rota da Seda. O resultado é uma política que oscila entre dois polos de poder, sem autonomia real. Enquanto a China amplia sua presença econômica, os EUA tentam manter a influência, e o governo brasileiro busca atrair capitais de ambos, mesmo que isso implique contradições ambientais e perda de soberania.
Essa postura revela a impossibilidade do governo Lula em romper com o modelo dependente e extrativista que há décadas caracteriza a economia brasileira. Ao aceitar o avanço desses projetos sob o pretexto do “desenvolvimento sustentável”, o país reforça sua condição de exportador de mercadorias com baixo valor agregado e relega a questão ambiental a um segundo plano. Entre a pressão das potências e os interesses do agronegócio, o discurso verde se converte em retórica, e os trilhos das ferrovias seguem conduzindo o Brasil pelos caminhos da dependência em meio às disputas imperialistas.
A natureza como obstáculo e a soberania em jogo
A política ambiental brasileira segue prisioneira de uma visão utilitarista: a natureza é um ativo, não um bem comum. O licenciamento ambiental é tratado como burocracia a ser contornada, e não como garantia de equilíbrio ecológico. Sob essa lógica, o meio ambiente só importa se puder gerar lucro, seja em créditos de carbono, seja em facilidades para exportação.
As comunidades indígenas e ribeirinhas são as primeiras vítimas desse modelo. Seus territórios são cortados, suas vozes silenciadas. As promessas de compensação raramente se cumprem, e os impactos sociais são ignorados em nome da “eficiência logística”. O país que promete liderar o debate climático global é o mesmo que empurra seus povos originários para fora da floresta em nome da soja e do minério.
Essa submissão aos interesses estrangeiros não é apenas econômica, é política. Cada concessão feita aos conglomerados internacionais enfraquece a capacidade do Brasil de decidir sobre seu próprio destino. As ferrovias que deveriam integrar o território nacional acabam integrando o país às rotas da dependência.
O Brasil precisa romper com a falsa dicotomia entre desenvolvimento e preservação. É possível construir infraestrutura voltada à integração interna, ao transporte público e à preservação do meio ambiente, mas isso exige um projeto de independência de classe e ruptura com o capitalismo, não uma política subordinada aos países imperialistas.