Internacional

Equador: A grande encenação do Estado de Exceção

LIT-QI, Liga Internacional dos Trabalhadores - Quarta Internacional

11 de janeiro de 2024
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O novo governo de Daniel Noboa – o maior empresário bananeiro do Equador – recria as narrativas do Narcoestado para legitimar um regime de militarização social. Em 8 de janeiro de 2024, após saber da fuga de Adolfo Macias (pseudônimo Fito), seis centros penitenciários em todo o país se amotinaram, incluindo a Penitenciaria del Litoral, Turi, El Inca, Latacunga, Ambato e Machala. O tão aclamado e aguardado Plano Fénix, uma das propostas que catapultou Noboa para a presidência devido à sua lógica “inovadora” de mão dura, continua a ser um segredo de Estado, ou melhor, uma encenação inspirada no autoritarismo sionista de Nayib Bukele

Editorial da Revista Crisis

O governo por decreto e estado de exceção parece estar na moda na América Latina. Milei propõe um poder executivo e legislativo concentrado em sua pessoa, enquanto Bukele impõe uma aparente estabilidade social, baseada na reclusão e no cerco à classe trabalhadora. Atualmente, El Salvador é o país com a maior população carcerária do mundo em proporção à sua população. Durante os dois anos desastrosos do presidente banqueiro, Guillermo Lasso decretou estado de emergência um total de 11 vezes.

Um dos melhores e mais pomposos roteiros foi colocado em cena no momento em que o Estado equatoriano concordou em ignorar o paradeiro de Fito. O que se seguiu a este infeliz acontecimento foi uma série de motins quase simultâneos nas principais prisões do país, que incluíram dezenas de agentes penitenciários detidos. A situação nas prisões do país consegue gerar a imagem adequada para aumentar o sentimento de insegurança e medo que já aflige grande parte da sociedade civil. Este estado material e psicológico das pessoas tem o potencial de facilitar uma justificação descarada da figura de um estado de exceção e uma militarização permanente do mundo da vida.

A próxima consulta popular a ser realizada nos próximos meses propõe um fortalecimento massivo da competência para as Forças Armadas e a Polícia Nacional, criando um quadro de impunidade que facilitaria o terrorismo de Estado. Por um lado, o Executivo propõe a presença permanente das forças militares nos espaços públicos, além do seu redirecionamento de uma lógica de defesa nacional para o controle social interno. As muitas experiências realizadas no nosso continente neste domínio -Videla, Pinochet, Stroessner, Rios-Montt, Batista e Fujimori, para citar apenas algumas – demonstram que o autoritarismo de Estado termina no terrorismo de Estado, implementado pela ultradireita radicalizada que aponta para a limpeza social.

O estado de medo é perfeito para criar um consenso marcado pela regressão conservadora. É cada vez mais comum ouvir comentários de nostalgia pelos esquadrões voadores do SIC-10. Em resposta, outra parcela importante da sociedade começa a fazer uma crítica cada vez mais consciente à legitimidade do próprio Estado. Uma polarização crescente torna-se mais evidente, enquanto a luta de classes se agrava. O Estado, por sua vez, apoia-se no estado de exceção e nas suas novas regulamentações, que lhe conferem o poder de suprimir – de forma mais aberta – direitos. Ou seja, o estado de exceção responde a um momento de crise de hegemonia e, portanto, deve ser reconstruída através do uso da força.

Para esta nova forma de Estado capitalista, é essencial reformar o Direito para regular de forma mais eficaz a vida social. Neste mesmo dia foi publicada a segunda parte das questões da consulta popular, que propõe abertamente a impunidade dos agentes da lei, num livre exercício do aparelho repressivo. O Direito – as leis – é a estrutura que entrelaça a exploração, a opressão e a repressão, como mecanismos de submissão contra a classe trabalhadora mundial. A consulta popular proposta pelo governo bananeiro, se vitoriosa, poderia levar o país a um novo momento no desenvolvimento do capitalismo periférico, que de forma alguma pode se alienar do contexto político autoritário mundial.

A narrativa que gera um fio condutor entre o Equador e o abuso de estados de exceção esporádicos, o estado de exceção permanente de El Salvador e o Estado fascista de Israel, é que todos estes são formas de Estados capitalistas. Um exemplo é que, simultaneamente, a República Bananeira pretende consultar uma reforma trabalhista com trabalho por horas em Zonas Francas que, como zonas econômicas especiais, alimentam o sistema de superexploração da maquila, com zero direitos ou estabilidade no trabalho.

No 36º aniversário do desaparecimento impune dos irmãos Restrepo – executado pelo pelotão anticomunista SIC-10, fundado pelo sionista Ran Hazit, amigo próximo de León Febres Cordero -, se promete impunidade total às forças repressivas, incluindo execuções extrajudiciais, com anistias gerais em tribunais especiais com benefícios. Noboa aumenta a já existente interferência sionista nas instituições civis e militares, com mega-prisões/panópticos, e importação de tácticas e armas “testadas” no terreno: precisamente na Palestina, contra os/as palestinos/as.

É fundamental compreender que o crime organizado está ligado à classe dominante, partilham interesses comuns e, portanto, colaboram entre si. Pelo contrário, a classe trabalhadora sofre as consequências exacerbadas desta aliança criminosa. Nenhum estado de exceção ou modificação no Decreto tem a intenção de melhorar as condições materiais do povo, pelo contrário, buscam gerar uma situação que facilite a sua exploração e subjugação.

É importante a resistência aos discursos que dividem os/as trabalhadores/as, que impossibilitam a sua capacidade de organização e que normalizam a militarização dos espaços públicos e a desumanização dxs pobres e dxs que lutam. Mais uma vez, a unidade da classe trabalhadora e de todos os setores populares é necessária para resistir a um novo ataque neoliberal e às suas novas formas de sujeição. Somente a organização é o caminho.

Retirado de https://www.revistacrisis.com/ publicado em 09/01/24