Fim do programa federal de escola cívico-militar não acaba com militarização das escolas
O governo Lula anunciou, nesta quarta-feira (12), o encerramento do PECIM (Programa Nacional das Escolas Cívico-Militares), instituído em 2019, pelo governo Bolsonaro. O MEC (Ministério da Educação) enviou um ofício aos secretários estaduais de Educação informando que o programa será finalizado.
Executado em parceria entre o MEC e o Ministério da Defesa, o programa deixa a gestão das escolas a cargo de militares da reserva das Forças Armadas, policiais e bombeiros. Segundo o MEC, 216 escolas aderiram ao modelo nas cinco regiões do país.
A pasta informou que está em tramitação uma regulamentação específica que vai nortear a efetivação das medidas, mas a orientação é que deverá ser feita uma “transição” das atividades para não comprometer o cotidiano das escolas.
No ofício n° 4/2023, o MEC informa que será iniciado um processo de “desmobilização do pessoal das Forças Armadas, envolvido na implementação e lotado nas unidades educacionais vinculadas ao programa, bem como a adoção gradual de medidas que possibilitem o encerramento do ano letivo dentro da normalidade necessária aos trabalhos e atividades educacionais”.
Segundo o MEC, cada sistema de ensino nos estados deverá definir estratégias específicas para reintegrar as unidades educacionais às redes regulares.
Medida insuficiente
O fim da militarização das escolas é uma reivindicação histórica da maioria dos educadores e especialistas em Educação. Isso porque o modelo é visto como uma medida autoritária que em nada ajuda no processo educacional.
O programa, inclusive, foi alvo de várias denúncias de abusos de autoridade e assédio por parte dos militares contra alunos e professores. Outro alvo de crítica ao modelo é a destinação de verbas públicas para a militarização e discrepâncias nos salários pagos a militares, muito maiores em comparação aos pagos aos trabalhadores da Educação.
No governo de Bolsonaro, a militarização das escolas foi uma das principais bandeiras da ultradireita, como parte de um projeto reacionário que incluiu outras ofensivas antidemocráticas na Educação, juntamente com outras iniciativas como a campanha “escola sem partido” e contra a “ideologia de gênero”. De 2022 a 2022, foram disponibilizados R$ 98 milhões ao programa.
Entretanto, o anúncio do fim do PECIM pelo governo Lula foi considerado como insuficiente por educadores.
“Uma política educacional de natureza autoritária, influenciada por importantes setores das forças armadas durante um governo militar como o de Bolsonaro, não se extingue por ofício circular. Ainda mais com seis breves parágrafos que não regulam em absolutamente nada os mecanismos da política”, questionou o professor da Faculdade de Educação da Unicamp, Lucas Pelissari, em artigo no site Brasil de Fato Paraná.
Pelissari compara o anúncio à falsa interrupção do cronograma de implantação do Novo Ensino Médio feito pelo governo em março. “Vejam o que temos, meses depois, no NEM: preservação total da política e, pior, seu aperfeiçoamento, com ampla participação de Conselho Nacional de Secretários de Educação (CONSED) e associações e fundações empresariais”, afirmou.
“A efetiva extinção do PECIM pressupõe a luta pela revogação, via decreto federal, do programa. Um novo decreto deve prever a articulação entre União e estados, apontando saídas concretas para a efetiva desmilitarização de todas as escolas sob influência do PECIM”, defendeu Pelissari.
A professora aposentada e integrante da Secretaria Executiva Nacional da CSP-Conlutas faz observações no mesmo sentido.
“O ofício fala no fim do programa federal, mas deixa a cargo dos estados a reincorporação das unidades que adotaram o PECIM. Só que ainda ontem vários governos estaduais, como São Paulo, Rio de Janeiro e Paraná, entre outros, anunciaram que vão manter escolas militarizadas e garantir investimentos estaduais nesse modelo autoritário que, de certa, forma também faz parte de um processo de privatização da escola pública”, disse Joaninha.
“Escola não é lugar de polícia. Uma educação de qualidade exige um ensino público e democrático, que priorize o estímulo ao conhecimento e o desenvolvimento dos estudantes e não uma educação disciplinadora de forma repressiva”, defendeu a dirigente.
A educadora Samantha Guedes, da direção do Sepe-RJ, também criticou a militarização da escolas e defendeu que o governo Lula precisa ir além da extinção do PECIM por um ofício.
“Sabemos que no capitalismo, a educação nunca será plena para os filhos da classe trabalhadora. E a militarização das escolas visa alienar os jovens, programá-los para dizer sim ou sim neste sistema. O PECIM deve ser extinto, mas é preciso muito mais. Para termos uma educação de qualidade e enfrentar os problemas nas escolas, inclusive a violência, é preciso combater todo o processo de militarização e privatização da escola, haver investimentos na educação pública, valorização dos trabalhadores da Educação, abertura de concursos públicos, a revogação do novo ensino médio e da BNCC”, cobrou a educadora.