Juventude

Balanço da Greve da USP e movimento estudantil

Balanço, lições, e a necessidade urgente de formar uma nova geração de lutadores que seja capaz de vencer

Rebeldia - Juventude da Revolução Socialista

22 de março de 2024
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Assembleia dos estudantes da USP

Depois de termos construído um grandioso movimento na USP, que se enfrentou com a Reitoria, com Tarcísio, e com todos os projetos de ataque e privatização, seja da USP, e também os externos como do Metrô, Sabesp e CPTM, e aqueles vindos pelas mãos de Lula (sobre esses temas, você pode ler aqui), é importante que os estudantes possam refletir sobre os erros e acertos antes, durante e no final da greve. Essa reflexão tem que estar a serviço de sabermos avançar mais e melhor as lutas do movimento estudantil.

O DCE e seus erros: omissão, vacilação política e propostas que não ajudavam na construção da luta

A greve se iniciou com uma explosão de revolta, que ocorreu não por causa do DCE, composto pelo Juntos, Correnteza e UJC, mas apesar dele, pois a entidade, ao longo do ano, não teve como seu centro a preparação dos estudantes para lutar. A falta de preparo significou que na maior parte dos cursos a greve foi debatida pela primeira vez na assembleia que deflagrou a greve. E em termos das assembleias gerais da universidade, o tema da greve só foi cogitado depois do caminho para isso ter começado a ser construído em cursos como a Letras, em que o Centro Acadêmico conta com a presença do Rebeldia e independentes.

O problema disso é que, para suportar uma greve, é importante que os estudantes tenham se apropriado do histórico de lutas do movimento estudantil para entender melhor as potencialidades da greve enquanto ferramenta de luta. Mas, da forma como foi, essa vasta experiência não foi socializada para a maior parte do conjunto dos estudantes. Muitos, por exemplo, nunca tinham ouvido falar da greve de 2002, não sabiam nada das movimentações de greves anteriores etc. Isso se torna pior ainda diante do cenário de anos de pandemia, que geraram uma grande inexperiência em várias gerações estudantis, que não viram muitas mobilizações sendo construídas e, portanto, tinham menos acúmulo ainda.

Além disso, para suportar uma greve, também é fundamental que na base exista alicerce para segurar a mobilização. Esse alicerce significa ter um agrupamento de estudantes, para além daqueles dos coletivos, que seja ponta de lança das coisas, organizados em comissões de base, grupos de trabalho, comitês de luta, construindo atividades políticas etc. Só que, como a greve foi improvisada pelas direções, não houve tempo para construir esse processo rico de engajamento e conscientização, e em muitos cursos quem segurou a greve foram unicamente aqueles que são dos Centros Acadêmicos, sem conseguir trazer mais pessoas. Isso é um problema, porque para construir uma greve forte precisamos de todos, e não só dos que já tradicionalmente se engajam no movimento estudantil.

Esses fatores cobraram um preço alto, porque tivemos uma greve menos firme do que deveria e poderia ser. Faltou aos estudantes o preparo subjetivo, de terem podido se apropriar dos acúmulos da luta, e objetivo, de ter condições concretas na base de segurar a greve, mesmo que viesse pressão dos professores, unidades, direções, da Reitoria e da mídia. Dessa forma, a força da greve se dissipou tão rápido quanto explodiu. Antes mesmo de completar um mês de greve, em alguns cursos a mobilização já dava indícios de começar a colapsar.

É importante dizer que isso foi assim não por culpa dos estudantes. Na verdade, os estudantes fizeram coisas impressionantes, à revelia das direções dos coletivos políticos dos CAs e do DCE. Foi por causa dos estudantes, que atropelaram essas direções, pressionando-as a entrar em movimento, que a greve existiu. Mas a responsabilidade por esses estudantes terem as condições necessárias para ficar mais tempo em greve com força é inteiramente daqueles coletivos que se propõe a conduzir as entidades e o movimento estudantil.

Como se não bastasse tudo isso, ao longo da greve o DCE teve uma política errada em vários momentos. Quando conseguimos arrancar propostas concretas da Reitoria, o DCE foi pra base dos estudantes superestimar o que tinha sido conquistado. É claro que foi importante termos conseguido avanços concretos. Mas superestimar positivamente, por um lado, desarma a continuidade da luta, porque passa a impressão de que já está tudo resolvido e nem apresenta as unilateralidades da proposta, e por outro lado, dá a impressão de que a preocupação do DCE é em ter algum saldo positivo pra poder encerrar a greve dizendo que, sob sua gestão da entidade, aquilo foi conseguido. Ou seja, fica parecendo que o DCE está preocupado com sua imagem, e não com a luta.

Esse erro de linha se combinou com outros erros no momento de tentar encerrar a greve. O DCE não encarou o encerramento da greve como algo que precisaria ser construído. Da mesma forma como a greve se iniciou de supetão, tentaram encerrá-la de supetão, sem fazer o debate mais amplo com os estudantes sobre os motivos que apontavam que talvez já não tivesse mais correlação de forças para seguir. Sem falar que, no fim, quando os cursos começaram a sair de greve, o DCE simplesmente desapareceu. Até hoje não tivemos uma assembleia geral para aprovar o encerramento da greve, e sequer uma explicação pública sobre essa posição.

O DCE errou no antes, no durante e no final da greve, apresentando posições que vacilavam, e que não serviram de guia dirigente para os estudantes. Além disso, a mesma vacilação e erro de linha existiu com a posição dos coletivos. O Juntos foi o principal polo da superestimação positiva dos avanços da greve, e teve vacilações na condução da greve por isso. O Correnteza, em vários momentos, ficava a reboque do que pensavam os estudantes, sem ter uma linha previamente definida sobre como seguir em luta. A UJC deu um giro de 180º na sua política e, ao final, rachou publicamente com os outros setores do DCE.

Os erros do DCE deram espaço para os setores cuja política leva à desmoralização do movimento

Essa série de erros foi o que fez com que um setor de coletivos, que defendia “greve infinita” e suas variações, tivesse mais espaço do que de fato ocupam na base dos estudantes. Diante da omissão e tentativa do DCE de impor o fim da greve, de cima pra baixo, esses setores, para se diferenciar, começaram a fazer um debate com os estudantes que se fundava na emoção, argumentos morais, e toda sorte de apelos que se baseavam em qualquer critério, menos na avaliação objetiva e racional sobre qual era o real momento que vivíamos na greve, tanto em relação à análise de como ia a greve nos cursos, e também as movimentações da Reitora.

Por exemplo, por mais de uma vez a Faísca deu a entender que aqueles que achassem boas as coisas arrancadas da Reitoria estariam corroborando com a precarização do trabalho na USP, por causa do tema do bandejão (veja mais no link do texto acima). O problema é que é possível defender o que arrancamos, bem como defender mais refeições no bandejão, e também continuar lutando por contratações e contra a terceirização. Não são coisas opostas, na verdade se combinam. Esse apelo foi extremamente deseducativo, porque nublou o entendimento sobre as conquistas que tivemos. Que são parciais, mas foram fruto da luta, numa greve que, diferente da maior parte das greves na USP, finalmente teve ganhos reais. Isso para nem falar do método argumentativo, que impunha um constrangimento moral aos estudantes, como se fosse culpa deles a proposta da Reitoria, e não uma política da própria Reitoria para dividir os estudantes e trabalhadores. A linha da Faísca endossou uma visão corporativista, que jogou estudantes um contra o outro, e estudantes contra trabalhadores, um desserviço pra unificação tão necessária da luta.

Ou ainda, nas últimas semanas da greve foram usados argumentos, por vários coletivos, de que só poderíamos parar quando conquistássemos tal ou qual tema, como o fim do Edital de Mérito. Nós temos pleno acordo com a luta contra esse edital, e achamos que essa deve ser uma das lutas principais de todos os estudantes. O problema é que, novamente, o critério utilizado para propor aos estudantes a continuidade ou não da greve não se baseia na análise criteriosa da correlação de forças para ver o que o conjunto dos estudantes estão dispostos a fazer na luta.

Esse tema do critério não é uma discussão menos importante, e é preciso que se tirem as conclusões para as próximas lutas que virão. Se a lógica da continuidade ou não da greve for unicamente nivelada em base a tudo aquilo que ainda não conquistamos, teríamos que ficar em greve para sempre, porque uma vez derrotado o edital de mérito, ainda faltaria mais bolsas, com reajuste, mais vagas na moradia e a luta pelos blocos K e L, melhoria do Crusp, mais refeições em todos os bandejões, com contratações, vagas para todos que fizessem o vestibular, e não um filtro social e racial através de uma prova, tudo isso pra começar a pensar numa USP mais democrática, e a lista seguiria. Então é claro que estamos a favor de continuar lutando pelo que não se conquistou, isso nem está em discussão, mas colocar como critério único essa avaliação distorce o entendimento sobre a força real para seguir. Por exemplo, teria sido fundamental que os estudantes se debruçassem sobre as seguintes questões: nos cursos, ainda existem estudantes envolvidos para além daqueles dos CAs ou dos que mais bancaram a greve? Os professores continuam apoiando? As manifestações dessa semana tem capacidade de ser mais cheias do que da semana anterior? Podemos impor uma nova derrota à narrativa da mídia? Etc

O nefasto dessas linhas é que levam rapidamente os estudantes à frustração. Sem uma análise paciente sobre todos os elementos para ver se temos capacidade de seguir, os estudantes acham que os limites da greve são culpa sua. A culpa não é dos estudantes, mas das direções dos coletivos que estão nas entidades, e que não criaram um cenário em que fosse possível a greve continuar numa dinâmica ofensiva ao longo de mais semanas, pelos erros que citamos anteriormente. Apontar corretamente os erros das direções não pode se confundir com semear ilusões que levem os estudantes à frustração. Essa desmoralização é perigosa, porque coloca em risco aquilo que é o principal saldo político da greve: os estudantes mobilizados e engajados. Quem sai de uma greve com a sensação de derrota, depois de ter heroicamente dado o seu máximo, dificilmente volta a se engajar. Por isso é crucial cultivar com carinho esse saldo político, é a única garantia de que a luta poderá seguir para além dos processos específicos.

A intervenção do Rebeldia e os princípios inegociáveis do movimento estudantil

O que guiou a intervenção do Rebeldia desde o início foi a tentativa de desenvolver a luta, sabendo ouvir as sensibilidades e dificuldades dos estudantes por toda USP, propondo a unificação do movimento estudantil, e do início ao fim nos guiando por alguns princípios fundantes da intervenção no movimento estudantil. Esses princípios são: independência de classe, democracia operária, combate às opressões, aliança com os trabalhadores e nos pautar pela sinceridade no movimento. Sem esses pilares, a vitória está mais longe de ser alcançada.

A bem da verdade, a política que o Rebeldia defende se pauta na independência de classe como eixo central há muito tempo antes da greve. Ter independência significa saber quem é aliado dos estudantes trabalhadores, e quem não, para que então seja possível organizar a luta de enfrentamento. Aqueles que estão do lado dos banqueiros, bilionários, empresários, dos que defendem a privatização e o desmonte da educação pública, e os que ajudam todos esses a se fortalecerem e a continuar no poder não estão do nosso lado. É exatamente esse o debate que o Rebeldia vem fazendo sobre o governo Lula, por exemplo.

Mas por que os debates prévios que o Rebeldia fez foram importantes para a greve? Porque dentro da Universidade existe um agente principal, que é a Reitoria, ancorada nas Direções, que tem como função exatamente garantir os interesses dos governos e da classe dominante na educação pública. Apesar de qualquer discurso que os indivíduos desses cargos possam fazer, A Reitoria e as Direções, enquanto instituições dirigentes da USP, nunca estarão do nosso lado. Saber disso é crucial para ter a resposta correta, e para ser ágil nisso. Por exemplo, se o Rebeldia fosse vacilante nesse tema, o mais provável é que, quando Paulo Martins (diretor da FFLCH) instituiu sua medida autoritária e tentou fechar os prédios da FFLCH, a nossa ação não tivesse sido imediata e incisiva como foi, chamando os estudantes a reagirem, ocuparem o prédio da Letras, e propondo a ocupação do prédio da Administração da FFLCH em resposta. Só fomos capazes de tomar essa atitude por entender que a Reitoria e seus agentes tem interesses antagônicos aos nossos, e que, portanto, não se tratava de uma confusão, mas de uma óbvia tentativa de afogar a greve antes dela nascer.

Por sua vez, o princípio da democracia operária é aquele que se baseia na noção de que o que a maioria decide deve ser acatado, ainda que a sua posição tenha sido derrotada e você não concorde. Por exemplo, o Rebeldia propôs o encerramento da greve em uma assembleia geral e perdeu. Frente a isso, não abrimos mão de nossas opiniões e continuamos a debatê-las com os demais, mas nos subordinamos à decisão da assembleia, e nos pusemos a tentar ajudar os cursos a continuar. Esse princípio é importante porque a nossa força reside em agirmos conjuntamente. Por isso que, quando ocupamos o prédio da Administração, fizemos uma assembleia na frente da ocupação, para que não fossemos nós a decidir os rumos da ocupa, mas todos os estudantes lá presentes. Isso nos deu mais força diante da Reitoria, e foi o que garantiu que abríssemos a mesa de negociações na greve. Nahuel Moreno, um importante dirigente trotskista, já dizia: “com as massas tudo, sem as massas nada”. Preferimos errar coletivamente com os estudantes, do que acertarmos sozinhos, porque assim, teremos a oportunidade de fazer os balanços conjuntamente e aprendermos também conjuntamente, o que possibilita o movimento estudantil de conjunto avançar.

O princípio da unidade com os trabalhadores foi crucial para que entendêssemos a importância que tinham as movimentações dos funcionários e professores dentro da USP. A paralisação dos professores nos dava força. A solidariedade ativa e a ação comum entre nós é fundamental porque cria essa rede de forças contra um mesmo inimigo. É por isso, também, que a saída dos professores de paralisação causa um grande baque. Além de virar um empecilho objetivo pra continuar a greve, com a pressão pelo retorno, também significa um “canhão” a menos apontado contra o inimigo. Esse princípio, além disso, foi fundamental para que construíssemos o dia 03 de outubro com todo o empenho necessário, por saber que, de igual maneira, assim teríamos mais “canhões” apontados contra o chefe da Reitoria, que é o governador.

Se a unificação da luta nos cursos e entre cursos diferentes, de cursos com professores e funcionários, e ainda com trabalhadores de fora da universidade, é crucial para determinar o grau da nossa força, é justamente importante que sejam combatidas todas as ideologias e pressões que jogam a favor da nossa divisão. Por exemplo, o corporativismo é a visão que diz que a luta do outro, que não é da minha sala, do meu curso, ou do meu grupo etc, não importa e não é relevante para a “minha” luta. A consequência dessa compreensão é que impossibilita de antemão que se criem melhores condições para lutar, tendo mais aliados, solidariedade e mais força. Além de que está ancorada numa visão política equivocada, fragmentária, que não dá conta de explicar que os problemas que os cursos, por exemplo, sofrem, por mais que sejam diferentes, tem uma mesma raiz de origem, e portanto, a luta unificada é o caminho.

É justamente por esse elemento, de ser contra as ideologias que nos dividem, que o combate às opressões também deve ser um eixo norteador da luta. As opressões como o machismo, racismo, LGBTIfobia, capacitismo, xenofobia, fragilizam e destroem um setor da classe trabalhadora, que é justamente quem mais sofre no dia-a-dia dentro da USP. Combater as opressões é importante para, em primeiro lugar, fortalecer os setores oprimidos. Ter estudantes fortalecidos, lutando contra aquilo que os afeta, é algo que contribui para o fortalecimento geral de toda a luta, mesmo para aqueles que não são afetados pelas opressões. Em segundo lugar, o combate é importante porque não será possível a unificação geral enquanto uma parte de nós for relegada a um patamar inferior, e não se sentir a vontade para se apoiar nos demais companheiros.

Por exemplo, uma mulher que constrói a luta e que é hostilizada com machismo, dificilmente voltará a lutar depois. Se alguma companheira é silenciada numa assembleia, ela dificilmente participará de outras assembleias. Algum companheiro PCD que não tiver atendidas suas demandas de acessibilidade, como as palmas silenciosas, não se sentirá à vontade para continuar participando dos espaços do movimento. Uma companheira negra que é ridicularizada perante os demais, sem ter feito nada de errado, vai se sentir mal e pode deixar de colocar suas opiniões e de ocupar um local de protagonismo político. E vejam, não estamos dizendo que não podemos divergir, e que os setores oprimidos estão sempre certos. O que estamos dizendo é que, se houverem diferenças políticas, elas devem ser debatidas em relação ao conteúdo político que carregam, e não se utilizando e se ancorando nas opressões para invalidar politicamente os argumentos, ideias e ações da pessoa.

Por isso consideramos que foi fundamental, e principista, que o Rebeldia tenha combatido opressões quando elas aconteceram na greve. Seja na situação em que nossa companheira mulher negra foi exposta nos grupos do whatsapp na Letras. Seja quando nossa companheira que foi xingada de vaca e burra numa assembleia geral. Seja fortalecendo os demais estudantes oprimidos que, por estarem na linha de frente da greve, estavam suscetíveis de passarem por situações assim. Não é consequente com a luta aquele que não trava um combate mortal contra todas as ideologias que nos dividem e enfraquecem.

O método de levar adiante disputas políticas se utilizando de opressões é o que chamamos de método do “vale-tudo” para sua posição vencer. O fim, que é vencer, justificaria o meio, que é oprimir. Faltar com a verdade dentro do próprio movimento, escondendo sua organização política, ou mentindo para seus companheiros, faz parte desse “vale-tudo”. Desrespeitar a opinião da maioria, impondo sua vontade individual, também. Essa é a lógica da democracia burguesa, dos acordões, manobras e negociatas, e deve ser repudiada por todos nós.

O que está em jogo a cada luta: um debate sobre como podemos vencer

O debate sobre os erros e acertos a cada momento da luta, bem como sobre os princípios norteadores da atuação no movimento estudantil, remetem ambos a uma mesma conclusão: a cada luta, está em jogo a disputa concreta que se trava contra o inimigo e o quanto somos capazes de fazê-lo ceder, mas também está em jogo se o movimento estudantil será ou não capaz de formar uma geração de ativistas que seja mais bem preparada para as lutas que virão.

Os nossos inimigos, como a Reitoria, governos, a mídia, a polícia, as empresas e a burguesia são muito poderosos e estão absolutamente relacionados entre si e preparados para nos derrotar. Se nós não conseguimos, a cada mínima luta, preparar melhor o nosso batalhão, para que estejamos cada vez mais coordenados para travar esse enfrentamento, isso significa que perdemos uma oportunidade de ouro de construir as mudanças que queremos ver não apenas para esse ano, nem para o ano seguinte, e nem só as mudanças em relação à educação, mas as mudanças necessárias para mudar o país e também as nossas vidas.

Nesse sentido, toma outra relevância o debate sobre os erros da greve. Os erros que, seja pela via da ausência da mobilização como norte, da oscilação política que não dá confiança aos estudantes, da falta de capacidade de explicar aos estudantes os desafios colocados, de semear ilusões que nublam o entendimento sobre o momento da luta, ou ainda, e principalmente, de defender um programa que não se enfrenta de maneira cabal contra todos esses inimigos, da Reitoria aos capitalistas, são erros que abrem brecha para a desmoralização, a desilusão e o despreparo.

Cada autocrítica que não é feita significa um atraso no entendimento dos estudantes sobre o que foi bom e ruim, logo, não ajuda a refletir sobre como continuar lutando de maneira consequente e correta. Cada passo oportunista que é dado, que tem como objetivo construir o seu próprio coletivo à revelia de preservar uma geração inteira de lutadores, é um passo que afasta a todos de conseguir lutar contra aqueles que nos atacam. Cada vez que se desrespeita a democracia operária, que se rompe o princípio de que não vale tudo no movimento, e que não se pauta pela independência de classe e aliança profunda dos jovens estudantes com os trabalhadores na luta contra governos e capitalistas, estamos um passo mais longe da possibilidade que temos de vencer.

O problema é que tudo isso leva à catastrófica consequência de botar em risco o saldo político mais precioso de todos, que são os lutadores e ativistas que despontaram, cuja consciência e entendimento avançaram a partir da experimentação num processo real de enfrentamento na luta de classes, algo que nem mil leituras e palestras poderiam, por si só, ensinar. E a única garantia que temos de continuar avançando, assimilando os aprendizados políticos e nos aprimorando na luta contra Reitorias, governos e a burguesia, é se temos pessoas que estão dispostas a isso, que querem ir mais além e mais a fundo nos seus entendimentos e na luta política na sociedade.

Transforme sua indignação em ação revolucionária: organize sua Rebeldia pelo socialismo!

O Rebeldia é uma organização política que tem como objetivo intervir em todos os processos de luta, partindo das demandas específicas de cada uma, e avançando rumo à luta contra todos os agentes do capitalismo que são os responsáveis por esses problemas. É por isso que, como parte da nossa militância, existem células do Rebeldia que atuam no movimento estudantil. Através de toda e cada luta dos estudantes, nossa prática se baliza, em primeiro lugar, a ajudar a própria luta a se desenvolver da melhor maneira possível, e em segundo lugar, a travar os debates políticos necessários que façam os estudantes entenderem mais a fundo o funcionamento da sociedade e, portanto, que entendam por que a luta não pode se limitar àquela reivindicação específica, mas deve estar conectada com uma luta social mais profunda, que se choque com os agentes dos problemas que temos na educação e nas nossas vidas.

Para fazer isso, é necessário estar atento ao que diz e pensa a base dos estudantes, para ter condições de desenvolver as lutas de acordo com o ritmo e as condições do próprio processo. Mas, além disso, essa missão só será consequentemente levada adiante se a indignação na base for canalizada em ação revolucionária, através do entendimento de um programa político, que apresente a situação do país, a conjuntura política do momento, que entenda os desafios, desde os mais mínimos, aos mais históricos, e que, por conta de todos esses elementos, tenha a capacidade de apontar as tarefas decorrentes para o próximo período. Ou seja, os próximos passos, os caminhos e saídas a serem seguidos.

O movimento estudantil tem a tarefa de seguir sendo capaz de mobilizar os estudantes e jovens trabalhadores para arrancar mais conquistas dentro da USP e em relação à educação. Mas, para além desses temas, estamos numa encruzilhada política. Tanto porque temos um governo estadual bolsonarista, que segue levando adiante o programa da extrema-direita para o país, o que significa que segue a tarefa de derrotar esse setor político. E também porque, por parte do governo Lula, ataques gravíssimos estão ocorrendo, e pior do que isso, está se construindo um projeto de país que, ao atrelar o movimento dos trabalhadores junto com a burguesia, não tem outra resultante que não levar à nossa derrota e desmoralização, e isso nós já vimos onde deu.

Mas ousamos dizer que a encruzilhada política é mais profunda: esses projetos expressam que, de uma forma ou de outra, e em que pese as diferenças que existem entre os governos, os trabalhadores continuam submetidos a projetos capitalistas. O problema disso é que estamos vendo e sentindo na pele a degradação das condições de vida num sistema capitalista podre e decadente, que leva à crise climática, guerras genocidas, apartheid, adoecimento mental, e uma absoluta falta de perspectiva não só em relação ao que será nossa vida no futuro, mas em relação ao que será, hoje, a vida das gerações jovens do mundo.

O único meio de intervir na realidade para tentar mudar os rumos da história é se nos organizamos politicamente, com um programa que não nos mantenha atrelados a um ou outro projeto da burguesia, mas que tenha como bússola unicamente aquilo que precisam os trabalhadores. Não tem como defender o estudante trabalhador estando com algum projeto da burguesia, e nós fizemos a experiência com isso nessa greve. Os interesses antagônicos dos trabalhadores e da burguesia nos colocam de lados opostos, não apenas em relação aos temas mais gerais da sociedade, como conflitos internacionais, mas inclusive em momentos determinados, como uma mesa de negociação numa greve.

Queremos convidar você, estudante que está lendo esse texto, que se experimentou na greve e na luta, a dar um passo adiante no compromisso social que você estabeleceu ao lutar por condições mais dignas de estudo para os jovens trabalhadores. Queremos te convidar a continuar fazendo a experiência com o engajamento político, e que você venha militar com a gente, nos ajudando a construir o Rebeldia, que é essa ferramenta política em constante construção, e que certamente tem melhores condições de ser construída se podemos contar com a sua presença. Queremos que você nos ajude nisso, e ousamos dizer que não há escolha. Ou nos organizamos politicamente sob a bandeira do socialismo, colocando todas nossas potencialidades, forjadas na luta, à disposição de transformar a realidade, ou o cenário que se apresenta para nós não só é o de que teremos que fazer mais greves, mas também o de que está em risco a nossa vida e a das gerações futuras.

Precisamos de você. Transforme sua indignação em ação revolucionária, e organize sua rebeldia pelo socialismo!