Lula e Trump: acordo ou submissão ao imperialismo estadunidense?
O líder da principal potência imperialista, Donald Trump, causou surpresa quando, em seu discurso na ONU, revelou que minutos antes havia abraçado Lula e tinha havido uma “química” entre eles. Trump disse que uma breve conversa entre os dois mandatários apontaria para o avanço das negociações em torno do tarifaço.
Vale lembrar que no dia anterior os EUA estenderam suas sanções ao advogado-geral da União, Jorge Messias. Assim como já haviam ampliado os efeitos da Lei Magnitsky aos familiares do ministro Alexandre de Moraes, em retaliação à recente condenação de Bolsonaro por tentativa de golpe de Estado.
No dia 6 de outubro, Trump ligou para Lula e prosseguiu em sua tática do assopro após a mordida. Fruto da conversa, o presidente estadunidense encarregou seu secretário de Estado, o reacionário (mesmo para os padrões trumpistas) Marco Rubio, para dar sequência às negociações. Do lado do governo Lula, o chanceler Mauro Vieira, o vice-presidente Geraldo Alckmin e o ministro da Fazenda Fernando Haddad, “defenderão” o país.
Enquanto fechávamos esta edição, uma primeira reunião com Rubio e Mauro Vieira havia acabado de acontecer, no mesmo momento em que Trump escalonava sua chantagem militar contra a Venezuela e o conjunto da América Latina.
Encontro marcado
Ao contrário do que tentou fazer parecer Trump e o governo Lula, o inesperado abraço não foi mera obra do acaso. Foi, pelo contrário, preparado de forma milimétrica após intensas conversas diplomáticas secretas, ações de escritórios de lobbies contratados pelo governo no Capitólio e na Casa Branca e até conversas diretas entre Joesley Batista (dono da BRF) e o próprio Trump. Joesley doou nada menos que US$ 5 milhões para a festa de posse de Trump.
Publicamente, o governo Lula retrocedia em sua campanha publicitária nacionalista (enquanto Haddad colocava na mesa as cobiçadas terras raras, afirmando à imprensa que estava disposto a negociá-las para amenizar o tarifaço). As declarações de Mauro Vieira, o qual afirmou que o plano colonialista de Trump para Gaza merecia aplausos foi outro importante indicador dessa mudança de discurso.
No dia 15 de outubro, às vésperas do esperado encontro entre Rubio e Mauro Vieira, Lula disse que não houve uma “química” entre ele e Trump, mas “uma indústria petroquímica”. A questão que fica é: Trump mudou de ideia, foi forçado a reverter sua política de ataques econômicos e políticos ao Brasil ou tem mais caroço nesse angu?

Mauro Vieira se reúne com Marco Rubio na Casa Branca
Rapina
O que Trump quer com o Brasil?

Manifestação contra Trump no Conune. Foto Júlio Anselmo
O tarifaço imposto por Trump ao Brasil em julho descarregou uma alíquota de 50% sobre os produtos brasileiros. Apesar de recair principalmente sobre as commodities (produtos primários para exportação), 27% atingem produtos industrializados, principalmente do Sudeste.
A diferença do tarifaço imposto por Trump ao Brasil do restante do mundo, porém, foram as justificativas políticas: defender Bolsonaro e a extrema direita golpista, e a “liberdade” das big techs estadunidenses pintarem e bordarem. Ou seja, é um ataque político e econômico contra a soberania nacional, que mirou até mesmo o PIX e a tradicional 25 de Março na capital paulista.
Quintal dos EUA
O governo Trump quer submeter ainda mais o Brasil aos seus interesses. Isso passa por forçar o deslocamento de parte da produção para o território estadunidense, como a BRF que, após fusão com a Marfrig, já havia indicado a intenção de mudar sua sede para os EUA. A Taurus foi no mesmo sentido após o tarifaço, prometendo transferir sua produção do Rio Grande do Sul ao país de Trump.
Passa por aumentar mais o déficit comercial do Brasil (o “prejuízo” entre o que o país compra e vende), que desde 1997 acumulava mais de US$ 42 bilhões em favor dos estadunidenses. O tarifaço aprofundou essa tendência, fazendo com que o déficit com os EUA atingisse US$ 1,77 bilhão em setembro, o maior do ano.
O tarifaço de Trump, porém, vai muito além dos números da balança comercial. Faz parte de uma pressão política para não punir os golpistas (mesmo com a condenação de Bolsonaro agora, seguirá como uma intimidação para 2026 em favor do resultado que melhor lhe agradar) e principalmente para o país entregar o “ouro” cobiçado pelo imperialismo estadunidense: as chamadas terras raras essenciais para os produtos de alta tecnologia, além de liberar de vez o mercado para as big techs sem qualquer regulação, abrindo mão de qualquer resquício de soberania nesses setores.
Morde, assopra, mas sempre arranca um pedaço
Lula e Haddad tentam fazer parecer que a negociação com os EUA se dará em nível de igualdade. O que não dizem é que, mesmo antes do tarifaço, a economia brasileira já estava submetida ao capital estrangeiro, principalmente estadunidense. Não apenas por meio da balança comercial, mas com a propriedade dos grandes monopólios imperialistas que, aqui mesmo, exploram diretamente a mão de obra, remetendo seus lucros para fora. Ou pelo pagamento dos juros da dívida pública, cujo arcabouço fiscal do governo Lula garante que sejam remunerados com uma das mais altas taxas de juros do mundo, desviando recursos de áreas como Saúde e Educação.
Qualquer negociação, nesse sentido, passa por entregar ainda mais o país aos ditames do imperialismo, ao custo de sua soberania, do desenvolvimento industrial e tecnológico. Essa chantagem já havia ocorrido em 1988, quando o então governo de Ronald Reagan impôs uma tarifa de 100% sobre o Brasil. O motivo: o país começava a desenvolver computadores que disputariam com o recém-lançado Macintosh da Apple e ainda não reconhecia a patente de medicamentos. O recém-eleito presidente Fernando Collor viajou a Washington antes mesmo de tomar posse, para garantir o respeito à patente dos medicamentos estadunidenses e prometer o fim do desenvolvimento da indústria de informática.
Já a tática de Trump é a do “morde e assopra”. Impõe uma tarifa, recua, mas sempre sai ganhando. No caso do Brasil, hoje, principalmente as terras raras e o caminho livre para as big techs, com a conivência e cumplicidade do governo Lula e de uma burguesia subalterna e capacha. O resultado é a perpetuação de nosso estado de subalternidade e subdesenvolvimento.
Entenda
O que são as terras raras nas quais Trump está de olho?

Terras raras são um conjunto de minerais essenciais para a produção de alta tecnologia, de baterias a mísseis ou painéis solares. Não são raras só pela disponibilidade, mas também pela dificuldade de se extrair e isolar os minerais.
A China detêm hoje cerca de 69% a 92% da produção de terras raras no mundo, variando com as fontes. Com a escalada da disputa interimperialista com os EUA, com Pequim restringindo a importação desses recursos, por um lado, e Trump respondendo com mais tarifas de outro, os EUA crescem o olho para o Brasil, país que detêm a segunda maior reserva do mundo, só atrás da China. Apesar disso, o Brasil não a explora.
O ministro Haddad já afirmou à imprensa que as terras raras estariam na mesa em troca de uma eventual redução das tarifas impostas por Trump.
Negociação é entrega
Em defesa da soberania, contra a entrega do Brasil
O governo Lula, o conjunto da burguesia e a imprensa tentam passar a imagem de que uma negociação com Trump é boa para o Brasil. O que não dizem é que uma negociação em que o país já está nas mãos dos EUA, e ainda mais com o tarifaço e uma série de sanções políticas contra autoridades, qualquer acordo já parte do princípio de que o país terá que abrir mão de mais do que já entrega.
Parte da classe trabalhadora e da população, submetida a essa propaganda, teme o desemprego e a inflação e apoia a negociação com Trump. É preciso explicar, contudo, que a situação do Brasil, de subdesenvolvimento, baixos salários, superexploração e quase metade do país sem saneamento básico, é causada pela exploração capitalista e a rapina imperialista. Ou seja, grande parte do que os trabalhadores produzem aqui é surrupiada e levada para fora, seja pela exploração direta dos monopólios estrangeiros, seja via pagamento dos juros da dívida pública ou dos dividendos das transnacionais que saem daqui sem pagar um centavo de imposto.
O aprofundamento da entrega do Brasil só vai piorar nossa situação de desindustrialização, subdesenvolvimento, pobreza e superexploração.
Por uma real independência
Uma mudança do país e das condições de vida da classe trabalhadora pressupõe nos libertarmos das amarras do imperialismo. Isso passa por estatizar os grandes monopólios estrangeiros, sob controle dos trabalhadores, proibir as remessas de lucros e dividendos e suspender o pagamento da dívida aos grandes banqueiros e fundos de investimentos.
O governo Lula, porém, apesar do discurso, nega-se até mesmo a retaliar o ataque dos EUA. Pelo contrário, coloca nossos recursos sobre a mesa. A luta contra o imperialismo estadunidense, portanto, passa também pela luta contra o projeto capitalista e entreguista do governo Lula e da burguesia, como o arcabouço fiscal e pelo fim da escala 6×1. Por isso, só a organização e a mobilização independente da classe trabalhadora podem conquistar uma verdadeira independência e as reivindicações da nossa classe.