Educação

Novo Ensino Médio: diante do impasse entre governo e congresso, seguir lutando pela Revogação!

Apesar das diferenças nas propostas do governo e do relatório de Mendonça Filho, ambos mantem a essência do NEM.

Paula Falcão

29 de dezembro de 2023
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revoga o novo ensino médio

Briga entre governo e congresso sobre as alterações no Novo Ensino Médio (NEM) esconde objetivo de ambos, garantir o aprofundamento da privatização da educação no país. Ao que tudo indica, a votação sobre as alterações acontece ainda esse ano. Aqueles que defendem uma educação pública, gratuita e de qualidade devem seguir lutando pela revogação do NEM.

O Projeto de Lei do governo Lula

Em outubro, o Ministério da Educação (MEC) do governo Lula enviou em caráter de urgência para o congresso, o Projeto de Lei (PL) 5230/2023 que propunha mudanças ao NEM aprovado em 2017. O PL era uma resposta à insatisfação generalizada da sociedade que clamava por mudança e tinha como base uma pesquisa pública realizada de forma tendenciosa que não abriu espaço para a reivindicação central dos movimentos que era a revogação do NEM.

O PL 5230 basicamente propôs ampliação da carga horaria da formação geral básica (FGB) de 1800 para 2400 horas; volta das disciplinas obrigatórias como sociologia, filosofia e artes, incluindo o espanhol – isso sendo reestruturado em até 3 anos; definição de 4 percursos de aprofundamento (o que eram chamados de itinerários formativos), sendo cada escola obrigada a oferecer ao menos 2 percursos; veto do ensino à distância (EaD) para a Formação Geral Básica (FGB); revogação do notório saber (disciplinas ministradas por profissionais não licenciados para aquela área).

Apesar destas mudanças, a essência da reforma aprovada em 2017 foi mantida, como apresentamos em artigo anterior. Aparentemente existia um consenso ao redor da proposta, da ONG Todos Pela Educação (TPE), que é um braço político dos empresários do setor da educação, até o PSOL, como pôde ser visto pela comemoração à época do envio do PL por figuras como Tarcísio Motta e Daniel Cara.

Arthur Lira e a queda de braço com o governo

No entanto, as disputas no congresso frustraram os planos do governo. Arthur Lira (PL-AL), presidente da câmara dos deputados decidiu fazer cabo de guerra com o MEC e o governo. Em primeiro lugar nomeou Mendonça Filho (União – PE) como relator do projeto. Filho era o ministro da educação do governo Temer quando o NEM foi aprovado. O ex-ministro em sua relatoria indicou uma série de mudanças no PL enviado pelo governo. A Carga horaria de 2100 horas para FGB, a possibilidade do oferecimento da modalidade de educação à distância (EaD) mesmo para as disciplinas da FGB e a permissão para profissionais de notório saber são algumas das propostas.

Além do peso no Congresso, a proposta conta com o apoio da maioria dos secretários estaduais de educação e também com os empresários do setor, que tem no TPE sua maior expressão. Lira colocou em votação e aprovou um novo requerimento de urgência, portanto, a matéria deve ir a vota na câmara ainda este ano.

O Papel do PT

Lula e o PT encabeçam um governo de conciliação de classes. A regra é negociar a governabilidade, entretanto, não é possível governar para todos como dizia o slogan de governos petistas passados. O PL 5230 foi uma tentativa de atenuar a realidade mantendo o projeto de privatização da educação. Porém, os empresários da educação não estão preocupados com a forma, querem garantir seus lucros. O centrão, nesse momento com Lira a frente, sempre se movimenta por quem dá mais. E sequer a unidade em torno ao PL 5230 foi possível.

O governo ainda em tentativa de diálogo com o centrão retirou o caráter de urgência da votação que estava marcada para o último dia 11, mas Lira fez uma demonstração de força e votou p requerimento de urgência no dia 13. Para piorar, o PT liberou sua bancada e alguns deputados votaram favoráveis ao requerimento de Lira. Em diversos veículos de comunicação matérias indicam que o principal imbróglio seria a carga horaria da FGB, ou seja, o governo Lula acha negociável os temas do oferecimento de disciplinas pela modalidade EaD, a permissão para que profissionais de “notório saber” ministrem aulas e tantos outros pontos.

O governo Lula não tem responsabilidade com a educação pública, recentemente colocou a MegaEdu, ONG financiada por Jorge Paulo Lemann, um dos bilionários do país, no lugar privilegiado para opinar sobre a conexão de internet nas escolas públicas. A MegaEdu participa do conselho do Ministério das Comunicações que define sobre a verba destinada a conectividade dos estudantes, valores que passam de 6 bilhões de reais. Lemman é aquele mesmo envolvido no escândalo das Americanas.

A “briga” entre governo e congresso esconde o objetivo de ambos, aprofundar a privatização da educação.

Apesar das diferenças nas propostas do governo e do relatório de Mendonça Filho, ambos mantem a essência do NEM. O que está na base da reforma aprovada lá atrás é abrir espaço para os grandes grupos empresariais da educação. Basta olharmos para o censo escolar que nos mostra o INEP. Em 2010, as matriculas nos estabelecimentos privados de educação básica representavam 14,6%, já em 2022 chegaram a quase 20%, são cerca de 2 milhões de matriculas a mais na rede privada nos últimos dez anos e isso coincide com o encolhimento das matriculas na rede pública.

Grande parte da verba do Programa Nacional do Livro e do Material Didático (PNLD) tem como destino editoras ligadas ao grupo Kroton Educacional, o maior grupo educacional do Brasil segundo ranking da revista Valor de 2019. Editoras como Ática, Scipione e Saraiva fazem parte do grupo Kroton. Verba pública indo diretamente para a inciativa privada.

Kroton, Yduqs, Ser Educacional, Ânima, BAHEMA e outros grupos educacionais privados se beneficiam do NEM. Parte desses grupos foram alavancados pela política dos governos para o Ensino Superior. O FIES e o PROUNI significaram e significam bilhões de reais do orçamento publico destinada aos grupos educacionais privados. Todos esses grupos citados acima são cotados na bolsa de valores, a preocupações de seus acionistas não é com a melhora da educação no país, mas com seus lucros. Os governos do PT, de Temer e de Bolsonaro estiveram a serviço do enriquecimento desse setor. O NEM é mais uma política de aprofundamento do processo de privatização e mercantilização da educação, assim como as propostas de mudança que estão em pauta.

Não é nosso papel defender uma proposta ou outra

Como dissemos, a essência do NEM será mantida aprovada uma proposta ou outra. Não nos cabe fazer a defesa de nenhuma dessas propostas. Setores e figuras do Psol que já defendiam o PL do governo, após as propostas de emendas intensificaram a defesa, foi o caso do deputado e pré-candidato a prefeito do Rio de Janeiro Tarcísio Motta, que chegou a verbalizar a troca da campanha pela revogação em defesa do PL do governo, ele disse: “Nós estávamos juntos com muitos movimentos sociais dizendo que era preciso revogar o novo ensino médio. Mas chegamos ao final com essa ideia de que era preciso haver uma mudança. E esta mudança se consubstanciou num projeto que o governo mandou pra cá. ” Outros setores ao se depararem com a disputa entre as propostas logo correram para a defesa do PL fo governo de maneira aberta ou velada.

Seguir na luta pela Revogação do NEM!

Devemos fortalecer a campanha pela REVOGAÇÃO do NEM. Mover as entidades sindicais e de juventude e conjunto dos movimentos sociais para assumirem a campanha. A troca da luta pela revogação pela defesa do PL do governo não ajuda a organizar os trabalhadores da educação de forma independente e com um programa de classe para educação. Uma proposta de ensino médio, assim como um projeto de educação para a classe trabalhadora só será possível de ser construído de forma autônoma e independente.