Nacional

RS: Construir uma forte oposição de esquerda e socialista a Sebastião Melo em Porto Alegre

Em unidade de ação e independência de classe, ir à luta para derrotar seu projeto privatista

PSTU-RS

30 de outubro de 2024
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PSTU chama a não dar um dia de trégua a Melo (MDB). A tarefa que está colocada é arregaçar as mangas e preparar as lutas

PSTU – Porto Alegre 

Sebastião Melo (MDB), assim que reeleito, assumiu um discurso aparentemente conciliatório. “Para nós, não tem terceiro turno. Vamos unir a cidade, vamos governar para todos”. Mas, na medida em que anuncia suas primeiras ações –  privatização do Departamento Municipal de Água e Esgotos (DMAE), fim da eleição direta para a direção das escolas, entregar a manutenção predial das escolas a iniciativa privada – fica evidente que continuará governando para os bilionários.  E, sobre as obras do sistema anti-enchente, não há como assegurar prazos, pois dependem das verbas dos “governos das outras esferas”.

Por isso, não podemos dar um dia de trégua para Melo. A tarefa que está colocada é arregaçar as mangas e preparar as lutas. Mas isso não significa deixar de refletir e debater sobre o que se expressou nestas eleições. Está na cabeça de todos nós: como um prefeito que naufragou Porto Alegre consegue se reeleger e com um percentual tão expressivo de votos? É fundamental não só debatermos, mas extrairmos as lições corretas desse processo.

A “institucionalização” do enfrentamento a Melo cobrou seu preço

Logo após a enchente de maio, a rejeição a Melo era enorme, com panelaços e manifestações espontâneas. O “Fora Melo” estava nas ruas, representando uma oportunidade de derrotá-lo antes mesmo das eleições. Havia espaço para a auto-organização dos atingidos pelas enchentes e um calendário de mobilização crescente. Mas a maioria dos partidos de oposição, como PT, PSOL e PCdoB, apostaram em Comissões Parlamentares de Inquérito (CPIs) na Câmara, como no caso de corrupção na Secretaria Municipal de Educação (SMED), na luta contra a privatização da Carris, sem qualquer desdobramento de mobilização ou de campanhas nas ruas.

Este erro não pode ser repetido.

E, já há quem alimente mais ilusões nessa estratégia, apoiando-se no fato de que, na próxima legislatura, o bloco de Oposição terá 12 vereadores, o que garantiria direito a “protocolar a abertura de CPIs”.

Evidente que a ação parlamentar pode ser utilizada, mas como um ponto de apoio às lutas. Contudo, o que temos assistido é o oposto: canalizar todas as lutas para dentro do parlamento. Isso, além de gerar mais expectativas na Câmara de Vereadores, que é um “balcão de negócios”, acaba acorrentando o movimento e levando cada vez mais a derrotas.

Melo é parte do quadro nacional de fortalecimento da direita e da extrema direita

O segundo turno confirmou a tendência que já havia se manifestado no primeiro: uma vitória dos candidatos de direita e extrema direita, em particular daqueles ligados ao “Centrão”. O PL cresceu no Rio Grande do Sul e elegeu a vice-prefeita de Porto Alegre na chapa de Melo. Um dos vereadores eleitos na capital gaúcha é primo do falecido coronel Ustra, famoso torturador da ditadura militar.

Lula (PT), assim como Bolsonaro (PL) havia feito, costurou aliança com o Centrão para assegurar a sua “governabilidade”, ficando cada vez mais refém do próprio Centrão, pois saem fortalecidos dessas eleições municipais figuras como Arthur Lira (PP), Gilberto Kassab (PSD) e Valdemar da Costa Neto (PL), e o próprio Zuco (PL) no Rio Grande do Sul.

E isto porque o dinheiro das chamadas “Emendas Pix” disparou em 2023. Essas emendas permitem que parlamentares enviem recursos diretamente para suas bases, aparecendo como obras da administração local.  E não é que a prática política da base parlamentar do PT ou do PCdoB seja tão distinta, mas têm acesso a menos recursos, comparados ao Centrão.

Como expressão dos bilhões da máquina parlamentar despejados nas cidades, a taxa de reeleição deste ano foi recorde, chegando a 80% nas capitais.

Ficou evidente que enchente não era responsabilidade de um só governo

E, de uma certa forma, a enchente de maio acabou aprofundando esta dinâmica no Rio Grande do Sul. Segundo afirmam analistas, desastres ambientais tendem a punir os governantes de plantão quando ocorrem a uma certa distância do pleito. Mas, em anos de eleição ocorre o oposto: a tendência é de reeleição. Isso porque, num primeiro momento, há mais injeção de dinheiro e auxílios para uma parte da população, além da retomada e execução de obras nos bairros. Ou seja, fica ainda mais forte a utilização da máquina do Estado como ferramenta de campanha, ajudando na visibilidade dos candidatos.

A destruição que aconteceu em Porto Alegre, também aconteceu em toda a região metropolitana. Em São Leopoldo, por exemplo, cidade administrada pelo PT a enchente atingiu 40 mil casas e desalojou 83% da população. Lá, assim como aqui, houve falhas nas manutenções dos sistemas de proteção.

E a polêmica entre Maria do Rosário (PT) e Melo ficou restrita a quem era “o responsável” pela enchente. Mas, no projeto de reconstrução, não havia nenhuma diferença significativa, pois os governos das três esferas acabam administrando com a mesma lógica. Já se passaram seis meses da enchente e ainda há 336,8 mil pedidos de solicitação do auxílio-reconstrução (R$ 5,1 mil), que aguardam resposta definitiva do governo federal. As prometidas casas dependem de uma burocracia absurda e de laudos controlados pelas prefeituras. Tratamento muito diferente foi dado às demandas da Federação das Indústrias do Estado do Rio Grande do Sul (Fiergs), da Fraport (empresa alemã que administra o aeroporto de Porto Alegre),  dos bilionários do agro e grandes empresários.

Abstenção recorde

O segundo turno registrou um recorde de abstenções em Porto Alegre: 34,83%, ou 381.965 faltantes. Os votos brancos foram de 27.249 (3,81%), e os nulos 26.811 (3,75%). Além disso, houve um cenário de apatia/indiferença durante toda eleição. Isto é reflexo da experiência de um setor da população que, por um lado, já percebeu que as promessas de campanha não se realizam e tampouco se identificou com os poucos candidatos que puderam ser vistos, uma vez que apenas 4 candidatos participaram dos debates e apareceram na grande imprensa.

O que aconteceu em Canoas, recentemente, demonstra que a população tem bons motivos para não acreditar no processo eleitoral: o prefeito recém eleito com a promessa de transparência  — Airton Souza/PL —  aparece num vídeo tirando um maço com centenas de notas de R$100 da cueca, o que tudo indica ser um caixa 2 de campanha e agora nega-se a dar explicações por ser uma questão “pessoal”.

Eleições: jogo em que o poder econômico dá as cartas

Além das “Emendas Pix”, há outros mecanismos que permitem organizar campanhas para lá de robustas.

Melo, na última prestação de contas, havia arrecadado mais de R$10 milhões, tendo como um dos patrocinadores o empresário Elie Horn, fundador da construtora Cyrela. Os 35 candidatos eleitos para a Câmara de Vereadores de Porto Alegre gastaram (do que foi declarado no TRE até o momento em que escrevemos essa texto) mais de R$7,7 milhões.

Por outro lado, candidaturas ideológicas como a do PSTU, além de terem poucos recursos, são excluídas dos debates e do tempo de TV e rádio. A candidatura de Fabiana Sanguiné foi totalmente invisibilizada, seja pelas atuais regras da lei eleitoral, seja pela cobertura dos grandes órgãos de comunicação, que aprofundam a desigualdade.

O processo eleitoral é controlado e viciado. Essa é uma democracia que beneficia os ricos e partidos da ordem. Infelizmente, partidos que tiveram origem em nossa classe, como o PT, se adaptaram a esse regime. E esta crítica não tem nenhuma relação com os questionamentos dos bolsonaristas. Nós defendemos, com unhas e dentes, as liberdades democráticas, contra qualquer tipo de golpismo. Mas isso não pode se transformar numa defesa desta “democracia” burguesa, cada vez mais antidemocrática.

Falsas teorias que se distanciam do problema

Surgem uma série de teorias por parte da esquerda institucional para justificar a reeleição de Melo. Que o problema foi o da escolha da candidata – Maria do Rosário – com um elevado índice de rejeição, porque é identificada com a pauta dos direitos humanos ou inclusive pelo método de escolha. Ou de que o problema é que a esquerda está valorizando em demasia as pautas identitárias. Esta última tese tem um objetivo nítido: justificar uma secundarização e inclusive abandono de demandas fundamentais das LGBTIs, mulheres e negros, como a questão de cotas, aborto, contra encarceramento e a legalização das drogas. Um rebaixamento ainda maior do programa para tentar aproximação com alas conservadoras da sociedade.

Também Manuela d´Ávila, num recente debate, fez corretamente um questionamento à esquerda majoritária que hoje é fiadora das instituições, do status quo e não dialoga com um sentimento antissistema, permitindo que este sentimento seja capitalizado pela extrema-direita. Também aponta corretamente que é um erro impedir críticas ao governo Lula, como tem acontecido com a maioria das entidades que estão atreladas ao governo. Porém, Manuela não é coerente com essas conclusões, pois defende manter como estratégia a construção de frentes eleitorais e ainda mais amplas, além de alimentar ilusões de que o governo Lula estaria em disputa.

Para nós há questões fundamentais a serem debatidas. O programa da frente em torno da candidatura de Maria do Rosário representou uma alternativa que se igualou a qualquer projeto social liberal. Um horizonte de um capitalismo democrático, que está totalmente dentro dos limites do arcabouço fiscal, ou seja, submetido aos bancos. Não denunciou os donos da cidade, grandes empresários que se beneficiam dos negócios e parcerias com a prefeitura e ainda menos defendeu qualquer enfrentamento ou ruptura dos acordos já firmados. Inclusive recuou no projeto de tarifa zero para o transporte coletivo.

O PSOL não foi diferente. Não houve nenhuma crítica ou diferenciação com o governo Lula.  A campanha de Boulos chegou ao cúmulo de incorporar a defesa do empreendedorismo, mantra da direita liberal.  O PSOL geriu a prefeitura de Belém com a mesma lógica, o que também se transformou numa grande frustração da população, o que levou à derrota do então prefeito, Edmilson Rodrigues, ainda no primeiro turno.

Lula e PT : cada vez mais para o centro e mais próximo de Leite

Mas ao contrário do que se poderia pensar, o resultado das urnas não está gerando uma alteração na estratégia adotada pelo PT, PCdoB e agora, inclusive o PSOL. Logo após o primeiro turno, Lula já havia declarado que quer um PT “menos inclinado para a esquerda e mais para o centro”. O vice-presidente nacional do PT, Washington Quaquá, afirmou que o PT precisa parar de errar e que a tática correta foi a utilizada no Rio de Janeiro, onde apoiou a reeleição de Eduardo Paes, do PSD, que até o início deste ano tinha Chiquinho Brazão no secretariado, preso por ser mandante do assassinato de Marielle Franco.

No Rio Grande do Sul, por exemplo, tomou ainda mais corpo uma série de acordos entre o PT e o governador Eduardo Leite.

No segundo turno, apesar Leite tenha declarado voto em Melo (MDB), houve acertos que envolveram as principais cidades do Estado.

Em Pelotas, quarto maior colégio eleitoral, Paula Mascarenhas, atual prefeita e presidente estadual do PSDB, assim como Leite, chamaram o voto em Marroni (PT). Em Caxias, 20º colégio eleitoral, o PT apoiou Adiló Didomenico (PSDB), que acabou sendo eleito.

Em Canoas, terceiro maior colégio eleitora, PT e PSDB estiveram como integrantes da coligação em torno do atual prefeito Jairo Jorge (PSD).

O argumento é que essa tática era necessária para enfrentar candidaturas ligadas ao bolsonarismo.

Mas, o que se configura vai além disso.

Apesar de oficialmente o PT ser oposição ao governo Leite, a bancada parlamentar do PT na Assembleia Legislativa acabou dando sustentação ao governo em vários momentos decisivos, como na construção e aprovação do “Plano Rio Grande”, plano de reconstrução pós enchentes que beneficia o grande empresariado. E, em matéria do jornal Zero Hora, nesta semana, foi divulgado que Lula cogita apoiar Leite como candidato ao Senado nas eleições de 2026.

Para virar este jogo: só com luta, disputa de consciência e independência de classe

 Em primeiro lugar, nossa estratégia não pode ser 2026. Está provado que não é disputando eleições, com arcos de alianças cada vez mais amplos, que vamos eliminar a extrema direita. É só olhar para o que acontece aqui e em vários outros lugares do mundo. É a decepção dos setores mais explorados e oprimidos da população com os ditos “governos amplos de esquerda” que contribui para o crescimento eleitoral dos setores da ultradireita.

São quase 16 anos de governos do PT na Presidência e não houve nenhuma mudança estrutural no pais. Não apresentaram projeto de diminuição da jornada de trabalho, sem redução de salário, nem se tentou reverter as privatizações, nem a reforma trabalhista de Temer, nem a reforma da previdência de Bolsonaro. Afirmam que o problema é de correlação de forças. Mas quem luta é tratado com uma sucessão de práticas antissindicais: nas greves dos técnicos das universidades, do Ibama, dos bancários, dos Correios, dos trabalhadores do INSS houve ameaças de demissões, multas e corte de pontos. Tudo isso gera apatia e desmoralização.

A combinação de um largo histórico de frustrações na entrega de promessas, como carne na mesa ou de um emprego formal, faz como se fortaleçam opções de atalhos.

Desgraçadamente a extrema direita convenceu um setor significativo da população de uma série de bizarrices, porque defende abertamente suas opiniões, fundamentam com elementos da realidade e conseguem fazer com que as pessoas cheguem a conclusões simplistas e absurdas. Ou seja, a ultradireita está disputando o povo, ideologicamente. Por outro lado, a “esquerda oficial” recua de todos estes combates e tentam aproximação com alas conservadoras da sociedade.

E o mais grave de tudo é o discurso de conciliação de classes. É bastante comum culpar-se os “pobres de direita” que não têm consciência de classe, que não se dão conta que pessoas como Pablo Marçal são bilionários e que têm interesses antagônicos aos seus. Mas como cobrar dos “pobres de direita” se Lula, de dirigente das históricas greves no ABC, passou a afirmar que o grande empresariado, as multinacionais, os agrobilionários são nossos aliados? Como cobrar dos uberizados que tenham consciência de classe quando são os próprios partidos da “esquerda institucional” que reproduzem o discurso do empreendedorismo? Um discurso que produz uma lógica oposta ao da organização coletiva e consciência de classe, pois o empreendedor “é cada um por si” para garantir sua sobrevivência.

Ou seja, são os inúmeros conchavos com o grande empresariado que provocaram imenso retrocesso na consciência de nossa classe. A necessidade da classe trabalhadora permanece sendo a sua independência total perante a burguesia.

Organizar a luta contra o atual e o futuro governo Melo. Oposição de esquerda a todos os governos!

Melo foi reeleito e sai fortalecido para implementar sua agenda ultraliberal. Um dos primeiros embates será a luta contra a privatização do DMAE. Outro tema muito importante é a luta pela reparação aos atingidos pela enchente, particularmente aqueles que perderam tudo ou tiveram suas casas parcialmente destruídas.

Mas os ataques dos governos das outras esferas também seguem com força. Leite quer realizar o leilão em que se transferirá a manutenção de 99 escolas estaduais para a iniciativa privada por um período de 25 anos: as chamadas Parcerias Público-Privadas (PPPs), cuja lei foi criada por Lula e Haddad em 2004.

O governo Lula, apesar de no discurso falar na emergência climática, segue insistindo na exploração de petróleo na Amazônia, na Margem Equatorial. O tema da responsabilidade fiscal exigida pelo mercado e os cortes de verbas das áreas sociais seguirão como prioridade. Simone Tebet defendeu, no último dia 28, que o governo corte políticas públicas “ineficientes”.

Para fazer o enfrentamento a esses graves ataques será necessário construirmos uma grande unidade de ação daqueles que afirmam querer derrotar a agenda do atraso e a ultradireita.  Uma grande campanha, envolvendo sindicatos, organizações do movimento popular e estudantil, buscando conscientizar a população sobre os efeitos nefastos das privatizações e parcerias publico privadas, defendendo a reestatização da Companhia Estadual de Energia Elétrica (CEEE), que continua provocando inúmeros apagões, e da Carris.

A CUT, UNE, MST e sindicatos importantes, que se subordinam ao governo, precisam ser pressionadas pela base para mudar de postura.

E mais do que isso, o que se coloca é a necessidade de construirmos uma forte oposição de esquerda e socialista a todos os governos, que dispute a consciência da classe trabalhadora para, inclusive, enfrentar o bolsonarismo. Do contrário, daqui a dois anos, estaremos fazendo o mesmo balanço.

A necessidade de um partido socialista e revolucionário, que organize a luta dos trabalhadores contra o sistema capitalista

Com partidos comprometidos com a ordem capitalista, mesmo que se oponham aos partidos de direita defensores de ditaduras, a classe trabalhadora e os oprimidos cada vez mais sofrerão as consequências da decadência deste sistema que concentra progressivamente a riqueza, aumentando a exploração. Um sistema incapaz de evitar suas próprias crises e que ameaça a vida no planeta.

É necessário construir um partido socialista e revolucionário que defenda e proponha à classe trabalhadora e juventude um programa para que elas protagonizem a revolução necessária contra esse sistema. O PSTU está dedicado a essa tarefa. Fizemos isso nas eleições deste ano com nossos poucos recursos e muitas restrições, mas com muita coragem e ousadia, não sucumbimos as pressões. Defendemos um programa que demonstrava ser impossível resolver as questões mais básicas se não enfrentássemos o poder e o dinheiro dos bilionários.

Se você concorda com nossas ideias, some-se a nós. Organize-se. Filie-se ao PSTU.

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Uma campanha a serviço da construção do partido revolucionário