Internacional

Tarifaço é parte do plano de Trump para impor nova ordem mundial imperialista

Redação

24 de abril de 2025
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Trump assina decretos na Casa Branca Foto Foto Joyce Boghosian/White House

Em 2 de abril, o mundo acordou estremecido pelo anúncio do “tarifaço” de Donald Trump. O governo do principal país imperialista, numa ação sem precedentes, impôs tarifas de importação, de forma generalizada, ao redor do planeta.

O anúncio atingia nada menos que 185 países. Das Ilhas Heard e McDonald (territórios controlados pela Austrália e povoados por aves, focas e simpáticos pinguins) até, principalmente, a China. As tarifas variavam de um piso de 10%, impostos a países como Brasil e a Argentina, governada por Milei, a uma taxa inicial de 104%, aplicada à China, que retaliou e, como represália, teve sua tarifa aumentada para 125%.

Nos dias seguintes ao anúncio, mundo afora, a Bolsas de Valores (onde são negociados os títulos financeiros, as ações de empresas etc.) despencaram. Isso porque os investidores e grandes monopólios financeiros, quando preveem que as coisas vão para o buraco, tratam logo de vender suas ações e correm para um “ativo” mais seguro. Ou seja, seja, fazem aplicações mais blindadas em relação às crises econômicas.

Normalmente, são os títulos do próprio Tesouro norte-americano. Agora, veja que interessante: caso ocorresse o que normalmente se espera, o dólar subiria com a alta da procura. Mas, aconteceu o contrário e os donos do dinheiro grande foram para o ouro.

América grande de novo?

Qual o plano de Trump?

Washington DC 02/04/2025Presidente Donald Trump anuncia tarifa de 10% para produtos importados do Brasil Foto Daniel Torok/ White House

O que está por trás do tarifaço de Trump? Num discurso tão cínico quanto hipócrita, o chefe do principal imperialismo alega que os EUA foram, durante anos, “saqueados, violados e espoliados por nações próximas e distantes, tanto amigas quanto inimigas, sendo que o que ocorreu foi justamente o contrário.

Os EUA se firmaram como principal potência capitalista, na segunda metade do século 20, através do aprofundamento da rapina e da espoliação dos demais países. Seja através da exportação de seus produtos, quando ainda mantinham uma forte base industrial em seu território; seja através da exploração direta, instalando empresas e formando grandes monopólios transnacionais, ou explorando diretamente recursos naturais, inclusive por meios militares.

Com suas empresas dominando a economia e explorando grande parte dos países periféricos, como o Brasil, os EUA se consolidaram como imperialismo hegemônico, não só do ponto de vista econômico, mas também político, militar e ideológico.

Isso deu base para que impusessem o dólar como a principal moeda de troca e reserva de valor. Desta forma, os EUA poderiam conviver com déficits crescentes (“prejuízos”, comprando mais que vendiam), pois tinham a maquininha de imprimir dinheiro nas mãos, sustentados pela exploração de todo planeta. O problema é que esse modelo se tornou insustentável, em função do crescimento da tendência parasitária da economia dos EUA, junto com a queda da taxa de lucro das multinacionais. Tudo isto agravado pela disputa com a China.

Para se ter uma ideia, o “déficit” norte-americano supera até mesmo seu próprio Produto Interno Bruto (PIB, a soma de todas as riquezas produzidas no país). A inflação se tornou um problema, corroendo a renda de um país que, embora conviva com baixos índices de desemprego, enfrenta a crescente precarização do trabalho (num país sem sistema público de Saúde, é bom lembrar).

O discurso de Trump fala em uma suposta volta dos empregos industriais, que ficaram marcados na lembrança dos norte-americanos pelos bons salários e pela estabilidade, embalando sua promessa em uma propaganda xenófoba e na perseguição aos imigrantes.

Trabalhadores na mira

Em meio a uma crise do capitalismo e a um processo de decadência dos EUA como principal potência imperialista, enquanto assiste o ascenso da China como potência imperialista emergente, Trump apresenta uma plano para tentar tornar a “América Grande Novamente” (slogan de sua campanha, “MAGA”, na sigla em inglês), o que significará mais ataques aos trabalhadores de todo o mundo, um agravamento da disputa entre os setores burgueses e imperialistas e o aumento das tensões políticas e militares em nível mundial.

O objetivo anunciado por Trump é tentar reverter o déficit comercial, buscando, também, trazer as indústrias chaves (de altíssima tecnologia e alto valor agregado) de volta para os EUA. Mas, na verdade, visa principalmente tentar impor um freio contra o crescimento da China. Tenta redesenhar a atual divisão internacional do trabalho (a hierarquia e função dos países) e as cadeias globais de valor (o “caminho” que os produtos e o capital percorrem para sua valorização e reprodução) e, ainda, ganhar e controlar a disputa tecnológica.

Inflação e perseguições

Num primeiro momento, o aumento de tarifas anunciado por Trump visa reduzir a dívida pública dos EUA, mas a medida pode gerar riscos inflacionários. Os custos podem atingir empresas que importam produtos e, principalmente, os trabalhadores, com alta de preços e perda de poder de compra.

A medida integra um plano mais amplo que inclui cortes no Estado, isenções fiscais para ricos e ataques a serviços públicos contra os trabalhadores, os setores oprimidos, tensionando o próprio regime. Basta ver a incursão contra as liberdades democráticas que está sendo promovida contra as universidades ou a perseguição aos imigrantes, às pessoas transgêneras e aos ativistas em defesa da Palestina.

Reorganização mundial a serviço dos EUA

Embora de difícil aplicação, a ideia de Trump e seus assessores econômicos é tentar renegociar os títulos da dívida norte-americana, que vencem no curto prazo, com taxas relativamente altas para o padrão histórico, para títulos sem liquidez (que você não pode “transformar” em dinheiro na hora). Ou seja, que não poderiam ser compradas ou vendidas antes de um prazo de 100 anos e com juros baixíssimos.

Fica nítido que o projeto de Trump também é dar uma pancada em vários setores burgueses e imperialistas, incluindo aliados, como a Europa e o Japão. Mas, o alvo é, principalmente, travar a China, o imperialismo emergente, mais fraco, mas mais dinâmico, ainda que o custo imediato seja alto.

O objetivo também é sugar a riqueza dos trabalhadores de todo o mundo, para pagarem a conta da disputa interimperialista. O entendimento desse setor burguês de ultradireita, que encabeça o governo, é que a velha globalização neoliberal dos últimos 40 anos, hoje, é um terreno que dá larga vantagem competitiva para a China. E, por isso, pretendem mudar a ordem mundial que, há algum tempo, já está em crise.

Instabilidade

O projeto de Trump vai agravar as tensões e a crise capitalista

O plano de Trump tem várias contradições e pode gerar problemas para o próprio presidente e os EUA, além de agravar as tensões mundiais.

Lembra que a fartura norte-americana se mantém pela força do dólar? Para voltar a ser um exportador de produtos industrializados de alto valor agregado, Trump vai ter que forçar uma desvalorização da moeda e aumentar a especulação sobre a possível perda do status do dólar como reserva mundial. Para além disso, precisa garantir uma renegociação dos títulos da dívida do Tesouro, para prazos mais longo, e tem tentado usar as tarifas para forçar isso.

Hoje, Trump tem muito mais apoio em vários setores da burguesia dos EUA do que no seu governo anterior. Mistura representantes da velha burguesia, das grandes empresas industriais (siderúrgicas, extrativistas, petroleiras e setores do agronegócio) com a burguesia mais moderna e tecnológica, como das “big techs” e figuras como Elon Musk ou Zuckerberg, convertidos à cartilha trumpista.

O grande agronegócio de soja foi um dos mais afetados pela guerra comercial, com a China substituindo importações dos EUA pelo Brasil. Paralelamente, a Apple acelerou envios de iPhones da China para os EUA antes da vigência das tarifas, enquanto seu CEO, Tim Cook, negociava com Trump.

Grandes bancos, como o JP Morgan, já anunciaram uma recessão ou até uma nova depressão, como nos anos 1930. Tanto que, dias após o anúncio do tarifaço, Trump recuou e disse estar disposto a negociar com os países que não retaliassem suas taxas. As bolsas recuperaram parte das perdas (e é evidente que alguns “sabichões” embolsaram alguns bilhões) e, enquanto fechávamos esta edição, Trump anunciava uma redução temporária de 90 dias das tarifas acima de 10%, com exceção da China.

Alvo é o imperialismo chinês

Mas, hoje, nenhum setor burguês dos EUA tem dúvida de que, se nada for feito, a China significa uma ameaça à hegemonia dos EUA no futuro. Assim, há importantes diferenças nos ritmos, sobre quem vai pagar a conta, sobre como fazer e em que proporção, mas não há dúvidas entre eles de que precisam levar a cabo uma disputa imperialista com a China. Tanto é assim que mesmo o governo Biden não retrocedeu das primeiras medidas de guerra comercial feitas por Trump, em seu primeiro mandato.

Ou seja, o projeto de Trump apresenta riscos, tem custos e agravará a disputa dentro da burguesia dos EUA e mundial, mas manter tudo como estava também não é uma opção para grande parte desta mesma burguesia monopolista.

Luta de classes, um obstáculo a Trump

Os trabalhadores e trabalhadoras dos EUA (e mesmo da China) irão assistir, calados e parados, a tudo isso? Pelo crescimento das manifestações contra o governo Trump, parece que não.

Já houve, inclusive, o início de perda de popularidade de Trump. E os efeitos políticos das medidas podem ser muito profundos. Tanto as divisões intra e interimperislista como a combinação de lutas operárias, populares e dos setores oprimidos nos EUA podem derrotar os planos de Trump, antes mesmo de serem completamente efetivados.

O destino dos EUA dependerá da luta de classes. Ainda está em aberto se a resistência dos trabalhadores e trabalhadoras conseguirá derrotar esses setores burgueses que, apesar de suas diferenças, sempre têm acordo em tentar fazer com que os trabalhadores paguem a conta da crise que o capitalismo imperialista criou.

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Querem que os trabalhadores paguem a conta pela disputa interimperialista

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