Nacional

Um assalto bilionário aos aposentados e pensionistas mais pobres

Governos são responsáveis por fraude no INSS

Diego Cruz

9 de maio de 2025
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Imagine você trabalhar a vida inteira, conseguir se aposentar e, todo mês que fosse retirar sua minguada aposentadoria, um ladrão afanasse sua carteira sem que você ao menos percebesse. Pois foi exatamente isso que aconteceu, a partir 2019, com pelo menos 4 milhões de aposentados e pensionistas, no que já é considerado o maior escândalo de corrupção da história do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS).

A diferença é que esse roubo era realizado via desconto na folha de pagamento e a vítima nem via. Estimativas apontam que, no mínimo, R$ 6,5 bilhões foram roubados de aposentados e pensionistas, através de descontos ilegais, no próprio INSS, por entidades fantasmas. Investigação da Controladoria Geral da União (CGU) afirma que esse esquema perverso tinha um alvo bem definido: idosos com deficiência, indígenas, analfabetos e beneficiários vivendo em áreas remotas.

Quadrilha organizada

O desvio bilionário teria se iniciado em 2019, durante o governo Bolsonaro. Entidades sindicais de fachada pagavam propinas a diretores da cúpula do INSS para obterem dados de aposentados e pensionistas. Depois, falsificavam assinaturas, autorizando o desconto em folha, arrecadavam milhões mensalmente, e lavavam esse dinheiro, através de várias empresas e paraísos fiscais.

O escândalo, porém, certamente não se resume à cúpula do INSS, aos lobistas e policiais envolvidos. Sucessivos governos e o Congresso Nacional atuaram para a execução e manutenção deste verdadeiro assalto aos idosos.

Quadrilha

Esquema começou com Bolsonaro e ganhou impulso no governo Lula

Se o roubo começou (ou foi estruturado) a partir de 2019, foi no governo Lula que a rapina ganhou tração e se multiplicou (veja o gráfico). Mais precisamente, sob a gestão do então presidente do INSS, Alessandro Stefanutto, defendido até o último minuto pelo ex-ministro da Previdência Social Carlos Lupi, que havia acabado de pedir demissão (na verdade, tinha sido demitido) quando fechávamos esta edição.

Além de desconsiderar milhares de reclamações de aposentados, pensionistas e entidades sérias, Lupi fez ouvidos moucos às advertências do Tribunal de Contas da União (TCU) e da CGU, que, desde 2023, alertavam para as irregularidades.

Wolney Queiroz, o novo ministro nomeado por Lula, por sua vez, era secretário-executivo do INSS e também nada fez para investigar a roubalheira. Mais do que isso, quando deputado, Queiroz votou contra a obrigatoriedade da renovação da autorização para o desconto em folha dos aposentados, a pedido de duas entidades investigadas no esquema.

A saída de Lupi nada muda. Ao contrário, só explicita como a quadrilha de ladrões de aposentados pobres, indígenas e com deficiência está encastelada na estrutura do Estado, da polícia e do Congresso Nacional, além das empresas privadas, que se refestelam com as terceirizações e o desmonte do INSS.

DNA corrupto

Corrupção faz parte do capitalismo

O capitalismo é, em si mesmo, corrupto. A corrupção começa pelo desvio bilionário do orçamento, para pagar juros a banqueiros, num sistema pouco ou nada controlado. As emendas secretas e não-secretas fazem jorrar bilhões de reais do Congresso Nacional para milhares de prefeituras, garantindo a manutenção do poder nas mãos de poucas famílias, das bancadas do boi e da bala e das grandes empresas.

O financiamento eleitoral, por sua vez, já é uma coleira para adestrar os representantes da burguesia nas três esferas do governo: municipal, estadual e federal.

A concentração de poder num Estado que gere os negócios da burguesia não pode ter outro resultado que não seja o de beneficiar os bilionários. Por dentro ou por fora das regras.

Na lógica capitalista do lucro a qualquer custo, os banqueiros e as grandes empresas vão fazer o possível para arrancar o máximo que puderem dos trabalhadores e trabalhadoras, inclusive e principalmente dos mais pobres. E, para isso, utilizam todo o arsenal disponível: lobbies, relações espúrias com parlamentares e agentes do Estado, informações privilegiadas etc.

Prisão e confisco dos bens dos corruptos e corruptores

No capitalismo, os trabalhadores produzem todas as riquezas, inclusive o que vai como lucro para os patrões ou os impostos que sustentam o Estado. E essa mesma burguesia, com o seu Estado, ainda rouba o pouco que resta para a sobrevivência da classe trabalhadora ao final de sua vida.

Agora, por exemplo, além desse escândalo, os créditos consignados estão na mira da CGU, com taxas irregulares, juros extorsivos e ainda mais fraudes. Ou seja, não se trata de o Estado ser mais ou menos corrupto, como afirmam os liberais que defendem privatizar tudo. O dinheiro da corrupção, como tudo no capitalismo, sempre sai do bolso do trabalhador e vai para os cofres da burguesia.

É preciso exigir prisão e confisco dos bens dos corruptos e corruptores e a restituição imediata do dinheiro roubado. A corrupção, porém, só vai acabar com o fim desse Estado capitalista, substituído por um Estado gerido e controlado pelos trabalhadores e a população pobre.

Aposentados

Governo Lula mantém massacre a aposentados e extrema direita quer aprofundá-lo ainda mais

Ministro da Previdência Social, Carlos Lupi Foto Lula Marques/Agência Brasil

Se trabalhadores, aposentados e pensionistas comeram o pão que o diabo amassou sob o governo Bolsonaro, não se pode dizer que, na gestão Lula, a situação tenha melhorado. Ambos os governos impõem uma política de desmonte da Seguridade Social, achatamento dos benefícios e uma série de ataques sobre a camada mais vulnerável da classe trabalhadora. Tudo em prol de uma política para beneficiar banqueiros e bilionários.

O governo Bolsonaro impôs a Reforma da Previdência e o congelamento do salário mínimo, que atingiu diretamente os mais de 28 milhões de aposentados e pensionistas que recebem o piso. Bolsonaro chegou a extinguir o Ministério da Previdência Social e o transformou, formalmente, em um puxadinho do superministério de Paulo Guedes.

Por isso mesmo, é de uma hipocrisia gigantesca a gritaria histérica com que, de forma oportunista, a extrema direita denuncia o esquema de fraude do INSS e exige uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) para, supostamente, investigar o esquema. Foi justamente sob o governo Bolsonaro que ele foi organizado.

É como pedir para que os ladrões investiguem seus próprios roubos. E, para piorar, transformam a tragédia desse crime em moeda de troca para negociar a anistia aos golpistas com a base do governo, o próprio governo e o Supremo Tribunal Federal (STF).

Governo tem culpa no cartório

Já sob o governo Lula, os aposentados e pensionistas, assim como o conjunto da classe trabalhadora, não tiveram alívio. Além de não ter revertido os ataques impostos durante o governo Bolsonaro, o governo Lula impôs o Arcabouço Fiscal, que limita os gastos sociais, para garantir o pagamento da dívida aos banqueiros, e, mais recentemente, baixou um pacote no Congresso Nacional que insere o salário mínimo nos limites desse teto de gastos repaginado.

Ou seja, aposentados e pensionistas continuam tendo sua renda corroída, ainda mais numa situação em que os alimentos e produtos mais básicos vivem uma explosão inflacionária.

Mais do que isso, o governo manteve a terceirização, através de “acordos de cooperação técnica”, para entidades e associações que têm em suas mãos os dados de 40 milhões de beneficiários, abrindo uma avenida para todo tipo de fraude.

O crédito consignado também entrega a folha de pagamento dos aposentados e pensionistas aos grandes bancos, num esquema de endividamento que, agora, só tende a piorar com a ampliação dessa modalidade aos trabalhadores com CLT.

A política de desmonte do INSS, por sua vez, segue avançando, com déficit de servidores públicos, sobrecarregados e submetidos a toda sorte de assédio moral. Situação que só faz aumentar a fila do INSS, que o governo Lula havia prometido zerar.

Novos ataques

Se a coisa está ruim, pode piorar. A Ministra do Planejamento Simone Tebet defendeu que, após as eleições, o governo teria uma “janela de oportunidade” para desferir ainda mais ataques, seja qual for o novo governo eleito.

“Temos uma janela que é após eleição, seja qual for o próximo Presidente da República, uma janela de oportunidade da PEC do apertar os cintos. Nós não precisamos mudar o Arcabouço, precisamos estabelecer certos parâmetros”, afirmou à CNN, referindo-se às despesas obrigatórias, dentre elas as aposentadorias. A política da extrema direita não é diferente. Querem apenas acelerar esse processo, como uma espécie de “via Milei” no Brasil.

Trata-se de um roubo muito maior que a fraude do INSS. Enquanto os fraudadores ostentavam carros de luxo, com o dinheiro roubado dos aposentados mais pobres, os banqueiros, através de sucessivos ataques às aposentadorias, enchem seus bolsos, através de uma política de arrocho dos benefícios garantidos pelo Arcabouço Fiscal e a dívida.

A diferença é que esse assalto não aparece no extrato bancário.

Separar o joio do trigo

Justiça e governo atacam organizações que representam os aposentados

A Justiça determinou a suspensão de todos os descontos, mesmo das entidades que realmente defendem os aposentados, inclusive aquelas que já denunciavam a fraude. É o caso da Associação Democrática dos Aposentados e Pensionistas do Vale do Paraíba (Admap), filiada à Confederação Brasileira de Aposentados e Pensionistas (Cobap), entidade com mais de 40 anos de atuação, e à CSP-Conlutas.

Aposentados e pensionistas, assim, estão sendo duplamente atingidos: ficam à mercê dos fraudadores encastelados no Estado e sem a proteção das entidades que realmente estão do lado dos trabalhadores.

Já havíamos alertado o governo sobre essas ocorrências. É preciso que as investigações possam ir a fundo e que as pessoas prejudicadas tenham seus recursos devolvidos o quanto antes”, afirma o presidente da Admap, Josias de Oliveira Melo, que completa: “o governo federal precisa ser rápido para separar o joio do trigo, excluir os golpistas e não prejudicar as organizações legítimas, que representam verdadeiramente os aposentados e pensionistas brasileiros.”

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