Uma polêmica com o PSOL-RS
Será nas ruas e com um projeto de independência de classe, e não uma frente eleitoral com PT e PDT, que poderemos derrotar a extrema direita e o projeto neoliberal de Leite
Temos acompanhado manifestações, em redes sociais e pela grande imprensa, de parlamentares importantes do PSOL-RS, como o deputado estadual Matheus Gomes, da corrente Resistência-PSOL e o vereador Roberto Robaina, da corrente MES/PSOL, acerca das eleições estaduais no ano que vem.
Distinto de outros estados, o PSOL do Rio Grande do Sul tem a hegemonia do MES – corrente que questiona a direção nacional por ter entrado de malas e muitas cuias no governo Lula, principalmente após a nomeação de Boulos como ministro.
O governo Lula/Alckmin, por acaso, também não é neoliberal?
Em recente entrevista intitulada “2026 exige grandeza” ao jornal Sul21, Matheus Gomes afirma que, no estado do Rio Grande do Sul, há 3 campos – o da extrema direita (que será ocupado pela candidatura a governador de Zucco), o campo neoliberal (dirigido pelo governador Eduardo Leite) e o campo democrático e popular que, para Matheus, inclui até o PDT de Juliana Brizola. Conclui que a unidade deste campo democrático e popular “impediria a vitória da extrema direita no Rio Grande do Sul e seria capaz de derrotar também o modelo neoliberal que se instalou no Estado”.
Em primeiro lugar, é espantoso Matheus incluir o PDT, um partido tradicional burguês, representante dos interesses do agronegócio empresarial do nosso estado e que, ainda por cima, faz parte do governo ultraneoliberal do Leite, na Secretaria de Trabalho. A bancada parlamentar do PDT votou junto com o governo Leite nos principais projetos.
Em segundo lugar, é certo que o governo Leite (antes no PSDB e atualmente no PSD) é extremamente neoliberal: privatizou a CEEE e a Corsan, retirou direitos de servidores do estado, modificou o código ambiental do estado a favor dos agrobilionários, entre muitos outros ataques, e precisa ser derrotado. Porém, gostaríamos que Matheus nos respondesse: o governo Lula também não segue a cartilha neoliberal? A elaboração do Arcabouço Fiscal para priorizar o pagamento dos títulos da dívida pública ao mercado financeiro, a generalização de parcerias público-privadas, a utilização do BNDES, financiando e realizando a modelagem de privatizações em todo o país, a manutenção do Programa Nacional de Desestatização – não fazem parte da receita neoliberal?
É justamente a manutenção deste receituário que hoje ameaça o DMAE, empresa pública de água e esgoto de Porto Alegre (cujo estudo/modelagem de concessão será elaborado pelo BNDES) e a TRENSURB (na ameaça de privatização porque segue constando no Programa Nacional de Desestatização).
Aliás, o Sindicato de Metroviários do Rio Grande do Sul tem realizado uma heróica campanha de denúncia sobre o papel do governo Lula que não cumpriu seu compromisso de campanha. Assim como denuncia o papel do BNDES – cujo presidente é Mercadante (PT) – que formalmente deveria estar voltado a projetos de desenvolvimento e investimentos públicos em infraestrutura e que, durante o ano de 2025, promoveu um recorde de PPP’s com um número aproximado de 150 leilões ao total.
Estas medidas, sob o governo Lula, podem até ter outro nome – “social-liberal”, “neoliberalismo inclusivo” ou “terceira via” – mas não deixa de ser a adesão da social-democracia ao neoliberalismo.
Não há frente eleitoral com o PT que não seja de apoio incondicional ao governo Lula
Roberto Robaina, dirigente do MES, divulgou um vídeo com a defesa da frente ampla eleitoral para as eleições estaduais do Rio Grande do Sul e critica “a alta cúpula do PT por não ter dialogado com o PSOL” e ter apresentado, pelas redes sociais, uma nominata de chapa completa para as eleições 2026. E afirma que “o mais importante é que se escolha um nome/candidato que tenha condições reais de disputar o governo do estado”, para impedir a vitória da extrema direita. Sugere, inclusive, o nome de Tarso Genro, ex-governador do PT, como um nome amplo. A única exigência que faz é que, numa frente para compor com o PDT, o partido precisaria romper, antes das eleições, com o governo Leite (mesmo fazendo parte de 2 gestões do governo Leite). No vídeo divulgado não há nenhuma exigência de programa.
O MES já fez a experiência com a eleição municipal de Porto Alegre de 2024, em que o PSOL apoiou Maria do Rosário (PT) desde o primeiro turno. O balanço que apresentaram após as eleições é que “a esquerda não disse o seu nome, não se apresentou como esquerda”. E Robaina sabe que, numa campanha eleitoral, em frente com o PT, seja quem for o cabeça de chapa – Tarso, Edegar Pretto, Paulo Pimenta ou até mesmo Manuela D’ávila (atualmente sem partido e negociando com PSOL e PSB ) – será uma campanha totalmente vinculada à campanha de Lula. Uma campanha de apoio político, incondicional, ao governo Lula. Em vídeo publicado em sua rede social nesta semana, o atual pré-candidato a governador pelo PT, comemora que a “feira está mais barata” – que a batata caiu de preço, graças ao governo Lula e sua gestão à frente da CONAB (Pretto é presidente da CONAB). Pretto ignorou que o preço da carne subiu 38,4% em um ano no estado, e não foi da picanha. Foi da carne de segunda. É bom lembrar que nosso estado é um dos que apresenta maior índice de endividamento – 42,10% da população está inadimplente – e que boa parte disso tem relação com o preço dos alimentos.
E o MES, diferente de Matheus/Resistência, critica a corrente majoritária do PSOL nacional, chamada PTL (PSOL de Todas as Lutas), por “silenciar diante de medidas neoliberais do governo Lula”. No recente artigo que consta no site do MES – 20 anos de PSOL: duas táticas contra a extrema direita e um impasse estratégico – após a entrada de Boulos no governo Lula, como ministro”, afirma-se – “a ala majoritária que capitulou diante da política petista de frente ampla, indo a reboque da estratégia hegemônica do PT de atender aos interesses das frações burguesas, a fim de supostamente isolar a extrema direita. Essa linha defende o apoio incondicional ao governo Lula, abdicando de fazer a disputa político-ideológica contra a austeridade neoliberal.”
É incongruente, em nossa opinião, que, apesar desta caracterização – que na nossa opinião é correta – o MES adote uma política eleitoral idêntica a da direção majoritária do PSOL.
2022 e 2026: O que justifica a mudança na política eleitoral do MES?
O MES defendia, em 2021, uma candidatura própria do PSOL no 1º turno. Naquele momento, a extrema direita e o governo Bolsonaro apresentavam muito mais riscos. Bolsonaro estava à frente do governo, com as Forças Armadas sob o seu controle, com centenas de militares ocupando pastas estratégicas do Estado. A extrema direita estava coesa em torno de Bolsonaro.
No artigo “As lições de Lênin e as eleições de 2022” Robaina conclui – “ Mesmo durante o regime militar, o PT não abria mão da cabeça de chapa. É o que chamo de seu componente de aprendizado leninista. O PSOL deve se apresentar com perfil próprio nas campanhas eleitorais, se postular como direção. Este é um ensinamento positivo da experiência do PT, sobretudo nos anos 80. As alianças que ocorram devem ser feitas tratando de se manter nesta regra, o que requer que o PSOL tenha a cabeça de chapa. Assim, a chapa própria do PSOL deve se afirmar como regra; 2) o PSOL deve rejeitar as alianças com os partidos burgueses. Aceitar tais alianças foi o componente que chamo de social-democrata e stalinista na elaboração petista”.
No mesmo ano, em 2021, o PSTU foi impulsionador do Polo, ao redor de um Manifesto em defesa de uma alternativa socialista e revolucionária para o nosso país. Debatemos nesse período distintas propostas programáticas ao redor da estratégia da revolução socialista. O MES se negou a aderir ao polo e compôs a campanha de Lula/Alckmin desde o primeiro turno, em 2022.
E agora, que a extrema direita no país está dividida entre várias candidaturas, com a prisão de Bolsonaro e sem controle do aparato do Estado, o MES está defendendo alianças com partidos burgueses, numa frente ampla. Aceitando tal aliança o MES/PSOL não estaria incorporando parte da elaboração social-democrata e estalinista?
Sim, é necessário unidade contra a extrema direita. Mas que unidade é esta ?
Um programa de governo não é o mesmo que um acordo para a luta ou unidade de ação em mobilizações. Por exemplo, a luta contra a tentativa de golpe do 8 de Janeiro, ou contra a anistia dos golpistas, foi uma luta unitária contra a extrema direita. Todos que concordassem com esta campanha, deveriam ser incorporados, inclusive partidos burgueses como PDT, PSB, etc. A PEC da bandidagem só foi derrubada porque houve manifestação de milhares nas ruas em setembro, e não por uma política do governo Lula que estava à frente da negociação da “dosimetria”. Derrubar a PEC da bandidagem, porque as ruas ganharam a opinião pública, foi a maior derrota que conseguimos impor à extrema direita, desde o início do governo Lula.
Uma coisa muito diferente é uma frente eleitoral, que apresenta um programa nas eleições – ou seja – quais medidas devem ser adotadas para resolver os principais problemas que nossa juventude e o povo pobre enfrentam no dia-a-dia. Não há unidade possível de programa com um partido que governou e governa nosso país por anos com uma política de conciliação de classes e de conciliação com o imperialismo.
Peguemos o exemplo do principal expoente da extrema direita que é Trump. Lula, mesmo depois do tarifaço, do apoio dos EUA ao genocídio de Israel contra o povo palestino, das ameaças de invasão à Venezuela e Colômbia, não só comemora a aproximação/química com Trump, como está costurando um acordo que significará ainda mais entrega de nossos recursos ao imperialismo. Lula está fazendo o que a burguesia nacional – em particular os exportadores – querem – reduzir a taxação seja a qualquer preço.
Um governo que se dispõe a derrotar a extrema direita, deveria se espelhar nas 7 milhões de pessoas que foram às ruas, em 18 de outubro, nos EUA. Numa histórica manifestação afirmaram: “Trump, No Kings” ( Sem Reis). Na pesquisa Ipsos-Ipec realizada logo após o anúncio do tarifaço, 49% dos entrevistados defendiam que o Brasil deveria responder ao tarifaço de Trump na mesma moeda. Ou seja – aplicar a lei de reciprocidade, ter proibido a remessa de lucros e dividendos das empresas dos EUA para fora do país, ter quebrado a patente de medicamentos, entre tantas outras medidas. Isto seria a desmoralização de Trump. Mas Lula seguiu a cartilha da FIERGS (Federação das Indústrias do RS) e da FARSUL (Federação da Agricultura do RS). Por isso, na capa do jornal Zero Hora (RBS/Globo) de 28 de outubro está estampado – “ Avanço no diálogo entre Lula e Trump geram otimismo entre os empresários”.
O PT diz que o governo Lula é refém do Congresso Nacional, mas elegeu membros do Centrão para presidir a Câmara e o Senado.
Por isto, três anos após a derrota de Bolsonaro nas urnas, a extrema direita segue viva. Michele Bolsonaro realizou, no dia 25 de outubro, um encontro em Soledade (RS) com 3,4 mil pessoas, segundo a imprensa, se utilizando de todo seu arsenal ideológico conservador, a fim de dar uma coesão ideológica à sua militância.
O papel da esquerda deveria ser o mesmo – apresentar um programa para disputar e fazer avançar a consciência da classe trabalhadora e da juventude, contra todos aqueles que oprimem e exploram.
Às vezes, pode haver uma derrota eleitoral e uma vitória política. Por exemplo, quando Lula perdeu em 1989, o PT saiu com moral alta e uma vitória política. Aquela eleição serviu para acumular forças.
Há que se ter um horizonte para além deste jogo eleitoral da democracia burguesa, que, sabemos, é onde o poder econômico e os capitalistas controlam tudo.
Sem construir uma alternativa desde já, através de uma oposição de esquerda e socialista ao governo Lula, não conseguiremos superar o projeto de aliança com a burguesia. Não sairemos desse engodo de vermos diversas facetas da direita surgindo e se fortalecendo, e os trabalhadores e trabalhadoras sem uma alternativa política e de organização à altura desta batalha. Nosso papel é, acima de tudo, explicar aos trabalhadores e à juventude que só é possível romper com a miséria do capitalismo e conquistar nossa libertação através das nossas próprias forças, independente de governos e patrões.
Nos últimos meses vivemos um levante da chamada Geração Z que protagonizou uma onda de mobilização no Peru, Madagascar, Marrocos, Itália, Nepal, Indonésia, entre outros países. É a demonstração que há fôlego e coragem nas novas gerações para enfrentar os ricos, os privilégios e o sistema. É aí que precisamos nos apoiar.
Nós, como revolucionários, vamos apresentar, nas eleições de 2026, mais uma vez, candidaturas e um programa que enfrentem a extrema direita e todos os governos, construindo uma alternativa da classe trabalhadora e socialista, sem partidos burgueses, sem rabo preso com os monopólios capitalistas e os banqueiros. E também, sem alimentar ilusões nesta ricocracia, devemos reafirmar a necessidade de auto-organização, da mobilização e da ação direta que não nos coloque submetidos aos grandes acordões por dentro do Parlamento.
E, com toda a humildade, convidamos todos os ativistas, militantes revolucionários de outras organizações a virem construir este programa conosco.
Para ter recursos
- Não ao Regime de Responsabilidade Fiscal/cancelamento da dívida pública do estado com a União
- Expropriação dos 17 bilionários do RS da lista Forbes que somam R$ 85,6 bilhões em patrimônio declarado
- Não aos subsídios para o agronegócio empresarial e fim dos incentivos fiscais às multinacionais
Para investir
- Aplicação imediata do orçamento – 12% em saúde e 25% na educação (que o estado não cumpre)
- Controle dos fundos de reconstrução pelas comunidades e atingidos pela enchente . Imediata entrega das casas para todos os atingidos
- Fim das PPP´s e terceirizações e incorporação dos terceirizados ao serviços público, com todos os direitos
- Reestatização CEEE e Corsan e que passem a ser administrada pelos trabalhadores e usuários