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Usina do Gasômetro: Melo (MDB) quer privatizar até os símbolos da cidade de Porto Alegre

Redação

9 de julho de 2025
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Usina do Gasômetro, um dos símbolos históricos da capital gaúcha | Foto: Alex Rocha/PMPA

Redação, com contribuição de Rose Colombo

A sanha privatista de Sebastião Melo (MDB), prefeito de Porto Alegre, parece não ter limites. Como se não bastasse querer privatizar o Departamento Municipal de Água e Esgotos (DMAE), o novo Hospital Presidente Vargas (maternidade de referência da cidade) e a manutenção de escolas da rede municipal, quer colocar todos os símbolos da cidade na mão do capital privado.

Além dos vários trechos da orla do Guaíba e do parque Marinha (maior parque da cidade), do viaduto Otávio Rocha (um dos cartões postais , no centro da cidade), o prefeito quer abrir mão de um espaço de lazer e cultural fundamental: a Usina do Gasômetro. Este é um ponto de encontro tradicional onde os porto-alegrenses se concentram para apreciar o famoso pôr do sol no Guaíba. Toda estrutura do imenso prédio foi reformada recentemente, com recursos públicos. E agora, com o argumento de sempre — de que a prefeitura não tem verba para sua manutenção — quer concedê-lo para gerar lucro para grandes empresas e grupos econômicos.

Este é mais um dos exemplos de espaços públicos que são abandonados, “fechados para reformas” por anos a fio, como tática para posterior privatização .

A história: do abandono à privatização

A Usina foi inaugurada em 11 de novembro de 1928 como uma fonte termelétrica de energia para Porto Alegre. Com a estatização da Companhia Estadual de Energia Elétrica (CEEE ) em 1959, passou a ser um espaço público, pertencente à União. Desativada em 1974, após um período de abandono, a União cedeu o local à prefeitura em 1982. Foi reaberta em 1991, como um espaço multicultural comportando diversas salas, teatros, galerias e cinema numa profusão de atividades que a tornaria uma grande usina artística — experimental e democrática — aberta ao público e que funcionou até 2017, quando foi fechada pelo então prefeito Marchezan (PSDB).

Aí veio a pandemia e logo depois, como numa combinação sinistra, o destruidor Marchezan foi substituído por Melo, o lobista de chapéu de palha. Diante de tantos lugares “fechados para reformas”, o novo prefeito veio com a ideia originalíssima de conceder a Usina para o setor privado.

Para isso, contou com a permissão da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) em 2022 para doação à prefeitura desse espaço da União (inclusive já tombado como patrimônio público).

Tal doação romperia com o acordo estabelecido em 1982, que deixa explícito o uso do local somente como espaço público. Tal definição está na cláusula 3ª do convênio firmado em outubro de 1982 entre União e Município. Com base nesse pressuposto, entre outros, é que entidades levaram documento, em abril de 2024, ao Superintendente de Patrimônio da União no Rio Grande do Sul, em que entre outros argumentos afirmam que “o efeito deste processo de privatização dos espaços é a cada vez maior dificuldade de ter acesso a um local para ensaiar e se apresentar ou expor suas obras, levando ao fim precoce de muitos grupos culturais e carreiras artísticas locais, inclusive de alguns grupos longevos”.

Um mês antes, março/2024, numa audiência pública esvaziada, o prefeito Melo apresentou seu projeto de concessão por 20 anos ao setor privado, desconsiderando todas as prerrogativas patrimoniais, como tem sido o “novo normal” na gestão da cidade.

“Reforma custou 3 vezes mais do que será investido em 20 anos de concessão”

Sob esse título, a matéria da jornalista Marihá Maria (Sul21- junho/25) não deixa dúvidas, o aporte de R$ 7,9 milhões previstos no projeto de Melo não chega perto dos R$ 20,6 milhões tirados dos cofres públicos. Um verdadeiro escândalo!

Em entrevista, na mesma matéria, o arquiteto e urbanista Tiago Holzmann da Silva, ex-presidente do Conselho de Arquitetura e Urbanismo do Rio Grande do Sul (CAU/RS) e do Instituto de Arquitetos do Brasil (IAB/RS), afirma que os valores propostos são “irrisórios” e estão muito abaixo do que seria razoável. “São R$ 7,9 milhões por 20 anos. Dá R$ 33 mil de aluguel por mês”, aponta Holzmann ao calcular o valor de aporte pago ao longo das duas décadas de concessão. “A gente não pode partir de um valor inferior a uns R$ 300 mil, R$ 400 mil por mês de aluguel de um edifício daquela magnitude”, complementa. Mais do mesmo até quando?

Infelizmente o processo de privatização dos espaços de arte, cultura e lazer da cidade são parte de uma reengenharia em que não há espaço para nada que não maximize as chances de lucro. O arquiteto aponta, nesse sentido, que “a previsão da Prefeitura de garantir o uso público do espaço não tem garantias reais.” O arquiteto relembra a situação da concessão do Auditório Araújo Vianna (ponto de shows históricos). Em 2019 a Opinião Produtora adquiriu a concessão para uso parcial do Araújo Vianna e do Teatro Túlio Piva em 2019 por 10 anos. O contrato estabelece que a Prefeitura tem direito a uma determinada cota de uso anual do espaço do auditório para a realização de eventos próprios mas “no caso do Araújo Viana, a Prefeitura arrecada pouquíssimo e sequer utiliza as suas datas para eventos públicos gratuitos ou eventos públicos de interesse da cidade. Os shows que tem ali são maravilhosos, mas é ingressos de R$ 200, R$ 300, R$ 500 reais. Ou seja, privadíssimo”

Nossa cidade não necessita de mais um espaço privado de cultura e lazer, que praticam preços proibitivos e impedem o acesso da maioria da população.

Exigimos do governo Lula que a União reassuma o espaço

Como alternativa, há setores como a deputada Maria do Rosário (ex-candidata a prefeita pelo PT) que defende que a União articule a cessão do prédio para o Banco do Brasil (BB) para a transformação num Centro Cultural vinculado ao Banco. Reconhecemos que os CCBBs existentes no país praticam preços bem mais acessíveis e inclusive promovem eventos de grande qualidade e gratuitos. Isto porque os bancos e outras empresas se utilizam destes espaços, não apenas como parte da sua política de marketing, como também para obter benefícios fiscais. O gerente do CCBB, por exemplo, é indicado pela diretoria de marketing do BB, um banco que , apesar de ter 50% de ações da União, é uma empresa e economia mista. Como tudo no capitalismo, suas ações que estão , inclusive na bolsa de Nova Iorque, respondem aos interesses do mercado.

Por isso, entendemos que nós, lutadores do movimento social e cultural de Porto Alegre, devemos, além de enfrentar com todas as armas possíveis a tentativa de concessão de Melo, também cobrar do governo Lula e da ministra da Cultura, a cantora Margarete Menezes, que se pronunciem publicamente e atuem por desfazer a doação do prédio à prefeitura. E que a União transforme esse espaço num centro cultural federal público, tornando-o um espaço para livre manifestação artística, com gestão escolhida pela população de Porto Alegre e grupos artísticos de nossa cidade.

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