Cultura

Carnaval: A luta em defesa do povo palestino ecoou nos blocos país afora

Defesa dos povos originários e quilombolas e a denúncia da violência policial também ganharam espaço

Roberto Aguiar, de Salvador (BA)

21 de fevereiro de 2024
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O ‘Bloco Acorda Peão’ arrastou mais de 800 pessoas pelas ruas de São José dos Campos (SP) | Foto: Roosevelt Cássio/Sindmetal SJC

Não teve Carnaval na Palestina. Enquanto brincávamos atrás dos trios elétricos, nos bloquinhos, nos grupos de frevo ou nos desfiles das escolas de samba, o Estado racista e genocida de Israel seguia bombardeando Gaza. 

Mas o povo brasileiro não deixou de expressar apoio e solidariedade aos palestinos em meio a maior festa popular do país. Dezenas de blocos carnavalescos assinaram um manifesto em apoio à causa palestina, outros tomaram esse tema como central em seus desfiles, como foi o caso do tradicional bloco ‘Acorda Peão’, formado por sindicatos e movimentos sociais da cidade de São José dos Campos (SP), onde cerca de 800 pessoas se reuniram para curtir o Carnaval e protestar. 

Militância do PSTU participa do ‘Bloco da Banda do Trem Elétrico’ | Foto: PSTU-SP

Na capital paulista, cerca de 30 blocos de rua assinaram o manifesto “Carnaval é diversão e resistência: Palestina livre”. A bandeira da Palestina esteve presente no desfile de vários blocos, como a “Banda do Trem Elétrico”, o “Sô Fia da Vida”, os “Unidos da Madrugada”, “Agora Vai” e “Unidos da Ursal”.

Belo Horizonte 

Carnaval de BH é resistência e solidariedade! Palestina livre do rio até o mar!”, dizia um cartaz no trio elétrico do bloco “Então, Brilha!”. A ação fez parte da campanha “Carnaval da Resistência e da Solidariedade” organizada pelo Comitê de Solidariedade à Palestina, também integrado pelo PSTU. 

‘Bloco Então, Brilha!’ na cidade de Belo Horizonte, capital de Minas Gerais | Foto: PSTU-BH

Ações foram realizadas durante toda a folia momesca na capital mineira em outros blocos, a exemplo do “Orisamba”, do “Pena de Pavão”, da “Maria Baderna” e do “Pisa na Fulô”.

Olinda

Na cidade histórica pernambucana, o bloco “Cabelo de Fogo” realizou seu 10º desfile. O cortejo, que foi acompanhado pela “Orquestra 100% Camará”, teve como tema a luta contra as opressões do Brasil até a Palestina. O bloco organizado pelo PSTU é uma homenagem à companheira Sandra Fernandes e seu filho Icauã, vítimas da violência machista, que nos deixaram no Carnaval de 2014.

Na terça-feira de carnaval, ‘Bloco Cabelo de Fogo’ ocupou as ladeiras da histórica Olinda, em Pernambuco | Foto: PSTU-PE

Abre alas para o protesto 

Defesa dos povos originários e quilombolas e a denúncia da violência policial ganharam espaço 

Com o enredo “Hutukara”, que na língua yanomami significa “o céu original a partir do qual se formou a terra”, a Escola de Samba Salgueiro exaltou a mitologia Yanomami e levantou a bandeira em defesa da Amazônia no Carnaval do Rio de Janeiro.

Napê, nossa luta é sobreviver! / Napê, não vamos nos render!”, diz a letra do samba-enredo da Salgueiro, em momento que o garimpo ilegal voltou a ocupar, com força, as terras yanomami no Norte do Brasil.

Salvador

Na tradicional “Mudança do Garcia”, que acontece na capital baiana, os militantes do PSTU e ativistas da CSP-Conlutas desfilaram com uma faixa cobrando do governador Jerônimo Rodrigues (PT) o fim dos assassinatos dos povos negro, indígena e quilombola. A Bahia tem sido palco de um forte conflito agrário contra indígenas na região Sul do estado e contra quilombolas da região do Recôncavo, com assassinatos de lideranças como Mãe Bernadete, do Quilombo Pitanga dos Palmares. 

Militância do PSTU e ativistas da CSP-Conlutas na ‘Mudança do Garcia’, em Salvador (BA) | Foto: PSTU-BA

São Paulo

Com um enredo em homenagem ao Quilombo Quingoma, localizado na cidade de Lauro de Freitas, na Bahia, a Escola de Samba Penha Grupos foi campeã do grupo de Acesso dos Bairros de São Paulo. 

O Quilombo Quingoma resiste contra a ofensiva do setor imobiliário, que juntamente com o governador do PT, Jerônimo Rodrigues, tenta roubar as terras da comunidade quilombola. A Escola de Samba da Penha ajudou a ecoar a luta do Quingoma. A militância do PSTU da Zona Leste e do Quilombo das Rosas participaram do desfile.

Militantes do PSTU participaram do desfile da Escola de Samba Penha | Foto: PSTU-SP

Já no desfile das principais escolas de samba da capital paulista, a Vai-Vai levou à avenida o enredo “Capítulo 4, Versículo 3, da rua e do povo, o Hip Hop: um manifesto paulistano”, uma crítica ao que se entende por cultura na cidade de São Paulo, que, por anos, tentou excluir manifestações culturais como o hip hop. 

O desfile, que ofereceu alguns recortes históricos, mencionando a Semana de Arte Moderna de 1922 e o lançamento do álbum “Sobrevivendo no Inferno”, dos Racionais MCs, de 1997, além de resgatar figuras importantes na história da música negra paulistana, como Nelson Triunfo e Sabotage, teve uma ala com pessoas fantasiadas de policiais, usando capacetes com chifres e asas vermelho-alaranjadas, fazendo alusão a demônios.

Os demônios da Vai-Vai foram destaque no desfile das escolas de samba na capital paulista| Foto: Divulgação

A escola de samba recebeu críticas do governador bolsonarista Tarcísio de Freitas e do Sindicato dos Delegados de Polícia do Estado de São Paulo (Sindpesp). A Vai-Vai fez um desfile certeiro, pois para a população da periferia, negra e indígena em sua maioria, muitas vezes as polícias atuam, sim, como verdadeiras hordas demoníacas. 

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